Cotidiano

Especialistas apontam falhas nas buscas por fugitivos de Mossoró

Os detentos de Mossoró são vistos como mais “furtivos”, com potencial maior de executar a fuga, justamente por adotarem estratégia discreta. Já em relação a cobranças do Congresso, a pasta encara clima menos ameaçador.

por: NOVO Notícias

Publicado 14 de março de 2024 às 16:26

Fugitivos de Mossoró estão há um mês conseguindo escapar da operação de recaptura . Foto: José Aldenir

Fugitivos de Mossoró estão há um mês conseguindo escapar da operação de recaptura . Foto: José Aldenir

A busca pelos dois fugitivos da Penitenciária Federal de Mossoró, no Rio Grande do Norte, chegou nesta quinta-feira (14) a um mês. Deibson Cabral Nascimento e Rogério da Silva Mendonça foram os primeiros a escaparem de uma cadeia federal, sistema que existe desde 2006. Cerca de 500 agentes tentam recapturar os fugitivos, ligados ao Comando Vermelho (CV), mas fracassaram até agora diante das táticas usadas pelos detentos e pela geografia da caatinga potiguar.

As informações são do jornal Estado de São Paulo. 

Especialistas afirmam que, em que pese os obstáculos geográficos do local (zona rural, presença de grutas, estradas vicinais), a dificuldade para encontrar os fugitivos de Mossoró dentro de um mês preocupa e indica falhas na execução dos trabalhos das forças de segurança.

Eles alertam também que, quanto mais o tempo passa, mais difícil fica prender novamente os dois fugitivos. “À medida que os dias vão passando e não há sinais de que eles não estão perto de serem capturados, eu confesso que fico mais cético e aumentam as probabilidades deles se tornarem foragidos por muito mais tempo do que desejamos”, diz Luís Flávio Sapori, sociólogo e professor da PUC Minas.

“Era de se esperar que, a medida que fossem encontrados vestígios, a área de vigilância fosse diminuída. Isso aumentaria as chances de captura. Mas não é o que aconteceu até agora”, afirma Sapori.

Outra razão citado por Sapori que faz o tempo jogar contra as buscas é próprio cansaço e fadiga dos policiais empenhados há quatro semanas na operação. “Há um desgaste natural dos agentes. Esse cansaço físico vai diminuído a capacidade de vigilância e monitoramento por parte deles”, diz.

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Membro da Comissão de Segurança Pública do Senado, Alessandro Vieira (MDB-SE) é um dos que pensa assim. “Claramente tem problema de coordenação nas buscas, isso pode ter gerado efetiva evasão daquele perímetro dos investigados, que já receberam em mais de uma oportunidade auxílio externo”, diz.

“Operações conjuntas, envolvendo forças com culturas e cadeias de comando diferentes, exigem planejamento bem feito e coordenação central. Me parece que isso demorou a acontecer”, critica.

O coronel José Vicente da Silva Filho também acredita ser mais difícil a recaptura após um mês. “É previsível que, se não apanhar o preso dentro de uma semana, é improvável que consiga em tempo maior.”

Outra dificuldade apontada por José Vicente é o fato de os detentos não estarem em uma área onde funcionam os seus negócios lucrativos, motivo que os levaria a permanecer na região. Como nada os prende ao local, é provável que os foragidos se desloquem de forma constante e, possivelmente, sem uma direção certa.

“Imagina uma área rural de Rio Grande do Norte, Ceará ou outros Estados vizinhos. Agora, é procurar uma agulha dentro do palheiro”, diz o oficial.

Com um mês de procura, é preciso considerar também o custo benefício da operação, analisa o especialista. Para ele, é prejudicial manter policiais fora das atividades para as quais as PMs originalmente devem se dedicar. “O trabalho da polícia, em geral, não é prender criminosos (nessas circunstâncias); é proteção com patrulhamento, policiamento”, diz o especialista.

“Rio Grande do Norte e Ceará são dois dos Estados mais violentos do País. Não se pode desperdiçar recursos com dois bandidos, quando existem muitos outros que também demandam preocupação”, afirma.

Segundo o especialista, a fuga revela “um enorme conjunto de falhas” na administração das penitenciárias federais. “Isso expôs as entranhas da gestão dos presídios. A ideia de gestão é manter funcionando tudo o que está programado. E o que vimos foi um enorme conjunto de falhas.”

A distância entre Mossoró e Baraúna é de aproximadamente 35 quilômetros e, ao longo deste quase um mês de busca, as ações da força de segurança foi se estendendo até chegar a divisa com o Ceará.

O produtor rural José Saldanha, 49 anos, explica que, pelo seu desenho geográfico, Baraúna é conhecida como uma “cidade formigueiro”. “A cidade faz divisa com muitos municípios e, como nossa zona rural é muito extensa, ainda tem as veredas e estradas carroçáveis que cortam pelo meio da mata”, explica ele.

Por Baraúna, o RN tem acesso aos municípios cearense de Aracati, Jaguaruana, Russas, Quixeré e Limoeiro do Norte, todas com barreiras montadas pelo policiamento, além das estradas vicinais.

A maior parte dos agentes de segurança estão na região norte da zona rural de Baraúna, uma área da cidade que concentra mais de 200 propriedades entre fazendas e sítios e movimenta 4 mil trabalhadores do campo. “Aqui tem fazendas de todo porte. As maiores, plantam mamão, banana e melão com destino ao mercado internacional, já os menores produtores abastecem o mercado aqui da região”, detalha Saldanha.

Nas duas vezes em que a força-tarefa aponta ter chegado próximo aos dois fugitivos, as informações foram repassadas pela comunidade rural e os vestígios estavam em fazendas ou sítios.

A primeira delas foi em 29 de fevereiro, vistos em um assentamento agrícola próximo de uma plantação de bananas. Já em 3 de março, os relatos são que fugitivos invadiram uma propriedade rural e agrediram um agricultor que estava sozinho no local.

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski voltou a Mossoró nessa quarta-feira (13) e afirmou que há fortes indícios de que a dupla segue na região. Ele diz ver “êxito” na mobilização, uma vez que os bandidos supostamente não deixaram o perímetro delimitado entre Mossoró e a divisa com o Ceará.

Internamente, a percepção é de que o maior dano à imagem da governo foi a fuga em si, mas a demora na recaptura incomoda. O argumento nos bastidores do ministério é de que a caçada em 2021 a Lázaro Barbosa, o “serial killer” do Distrito Federal, foi mais veloz devido ao rastro de violência deixado pelo criminoso, que fez reféns e trocou tiros por diversas vezes com a polícia.

Os detentos de Mossoró são vistos como mais “furtivos”, com potencial maior de executar a fuga, justamente por adotarem estratégia discreta. Já em relação a cobranças do Congresso, a pasta encara clima menos ameaçador.

“Não são presos fáceis de serem capturados, por isso estavam em presídios de segurança máxima. O governo federal tem de reconhecer que negligenciou, apresentar os culpados no sistema penitenciário, porque ali teve facilitação. Está na hora de suspender gastos, essas coisas midiáticas que não vão prender (a dupla)”, disse Fraga ao Estadão, em referência ao uso de drones e quantidade de agentes.

Por outro lado, elogia a resposta à crise. “O ministro estava com seis dias no cargo. Tomou conhecimento do caso, foi lá, exonerou toda a diretoria, instalou processo apuratório.”

 

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