A estimativa é de que os peritos da PF levem cerca de um mês para analisar todos esses monitoramentos. A corporação afirma que a Abin teria realizado atos ilegais de espionagem, inspecionando a localização de ministros, políticos, jornalistas e advogados.
Publicado 4 de novembro de 2023 às 14:33
A Polícia Federal resgatou 30 mil monitoramentos ilegais feitos pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL). Esses registros haviam sido apagados e havia apenas 1.800 ainda disponíveis. O órgão foi alvo da operação Última Milha no dia 20 de outubro. Além de ter o prédio vasculhado, dois servidores da Abin foram presos e outros tiveram seus endereços como alvo de buscas e apreensões.
A informação dos monitoramentos ilegais recuperados é do colunista Lauro Jardim, do jornal O Globo. A estimativa é de que os peritos da PF levem cerca de um mês para analisar todos esses monitoramentos. A corporação afirma que a Abin teria realizado atos ilegais de espionagem, inspecionando a localização de ministros, políticos, jornalistas e advogados.
Isso era feito através de um programa chamado FirstMile, feito pela empresa israelense Cognyte (ex-Verint) e comprado pelo governo brasileiro em 2018. A ferramenta detecta os sinais de 2G, 3G e 4G trocados entre celulares e torres de telecomunicações para fornecer a localização exata dos aparelhos Basta, para essa busca, ter o número do telefone.
Nos 1.800 monitoramentos ilegais que foram inicialmente encontrados pela PF, havia um homônimo do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), o que reforça o indício de que ele foi um dos alvos dessa operação de espionagem. As demais pessoas da lista estão sob o sigilo das investigações.
Durante a gestão Bolsonaro, a Abin foi comandada pelo seu correligionário Alexandre Ramagem (PL-RJ), que era delegado da PF e hoje é deputado federal. Ele fez a segurança do ex-presidente depois do atentado em Juiz de Fora, em 2018, e caiu nas graças do clã Bolsonaro. Prova disso é a proximidade com o vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ), que se interessava pelo funcionamento da inteligência do governo do pai.
Além do vínculo de amizade, o Estadão revelou que Ramagem emprega, no seu gabinete de deputado federal, uma empresa de comunicação comandada por dois ex-integrantes do “gabinete do ódio”, uma rede de comunicação violenta e ancorada no disparo de fake news. O “gabinete” era encabeçado por Carlos, o “02? do ex-presidente.
As investigações da PF sobre a espionagem ilegal feita pela Abin colocam Ramagem e os Bolsonaro na mira. Isso porque, além de uma eventual responsabilidade vinda da gestão, em vários momentos o ex-presidente mencionou que possuía uma “Abin paralela”, que lhe fornecia informações “confiáveis”. Bolsonaro tentou colocar Ramagem na chefia da Polícia Federal, mas foi impedido pela Justiça.
No dia da operação, 20 de outubro, dois servidores da Abin foram presos: Eduardo Arthur Izycki e Rodrigo Colli. Eles são suspeitos de estarem diretamente envolvidos com os mais de 30 mil monitoramentos ilegais.
Na noite desse mesmo dia, a Casa Civil – pasta à qual a Abin passou a ser subordinada no governo Lula, deixando o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) – anunciou a demissão dos dois.
A causa, no entanto, foi outra: eles respondiam a um processo administrativo disciplinar por apresentarem-se como donos de uma empresa privada em um pregão do Comando do Exército, o que é vedado para servidores públicos.
Além dos dois, o secretário de Planejamento e Gestão, Paulo Mauricio Fortunato Pinto, foi exonerado do cargo no último dia 24. Ele era o número “03? da Abin. Na operação do dia 20 de outubro, a PF apreendeu US$ 171,8 mil em espécie na casa dele. Dois diretores, cuja identidade não foi revelada, foram dispensados das funções.
A operação FisrtMile e as investigações conduzidas pela PF antagonizam a sua versão e a da Abin. A Agência divulgou uma nota no último dia 20 afirmando que já possuía procedimentos administrativos internos para investigar as mesmas questões visadas pela PF, e que vinha municiando tanto a corporação quanto o Supremo Tribunal Federal com os resultados das usas diligências.
É como se a PF, autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes, tivesse “atravessado” a Abin. Desde que o governo Lula assumiu a gestão, tem trabalhado para desmilitarizar as estruturas de governo. A mudança da pasta da Abin é um desses gestos.
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