Cotidiano

Exame oftalmológico pode ajudar no diagnóstico de esquizofrenia, diz estudo

Dados de trabalho conduzido por pesquisadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR) mostram que pode haver uma relação direta entre alterações encontradas na retina e pacientes com o transtorno mental

por: NOVO Notícias

Publicado 25 de agosto de 2023 às 09:19

Foto: Pixabay

A retina, um fino tecido que reveste a camada de trás dos olhos, é o único lugar do corpo em que médicos podem observar os neurônios sem precisar abrir o crânio. A partir dessa possibilidade, pesquisadores do Programa de Pós-Graduação em Medicina Interna e Ciências da Saúde da Universidade Federal do Paraná (UFPR) publicaram um estudo que mostra a chance de haver uma relação direta entre marcadores biológicos, como as alterações na retina, por exemplo, e o diagnóstico de esquizofrenia.

Essa pesquisa, de caráter inovador, apresenta resultados animadores, segundo os cientistas. O desenvolvimento dessa técnica pode abrir possibilidades de um novo diagnóstico para a doença, que atinge cerca de 21 milhões de pessoas no mundo, e quase 1% da população brasileira, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS).

Dr. Marcelo Alves Carriello é psiquiatra e mestre pela Pós-Graduação em Medicina Interna e Ciências da Saúde da UFPR. Ele conta que o interesse pela pesquisa surgiu por meio da leitura de artigos divulgados na área, em constante crescimento. Por isso, junto de seu orientador, Dr. Rafael Massuda, e em conversa com o médico oftalmologista Dr. Mario Sato, resolveu investigar, durante o mestrado, a relação entre duas áreas da medicina: a psiquiatria e a oftalmologia.

A aproximação entre esses dois ramos, que em princípio podem parecer distantes, foi suficiente para alcançar resultados preliminares de grande impacto. “O que percebemos foi a redução do volume da mácula [pequena região no centro da retina] nos pacientes com esquizofrenia quando comparado ao de pessoas da mesma faixa etária e sexo, mas sem transtornos mentais”, conta o pesquisador. Essa parte chamada “mácula” permite, aos seres humanos, uma visão nítida e detalhada. As suas células convertem a luz em impulsos elétricos, que são enviados ao cérebro.

Dr. Mario Sato, que é professor associado de Oftalmologia na UFPR e responsável pelo setor de Neuro-Oftalmologia e Eletrofisiologia Ocular do Hospital das Clínicas, dá destaque para essa aproximação entre as áreas. “São muitas as doenças psiquiátricas que afetam a estrutura e a função do cérebro”, comenta.

Da mesma forma, Dr. Marcelo aponta que essa pesquisa tem um papel importante para somar evidências. “A pesquisa conjunta foi uma forma de encontrar, a partir do exame biomarcador, a esquizofrenia, visto que há características biológicas de neurodegeneração (perda de neurônios) observadas nesta doença, e o olho seria uma extensão do sistema nervoso central (olho e cérebro possuem a mesma formação embriológica)”, finaliza.

Como é feito o diagnóstico de esquizofrenia

A linguagem médica caracteriza a esquizofrenia como um diagnóstico clínico. Ou seja, não é possível fazê-lo a partir de exames de sangue, é necessária a avaliação por parte de um profissional com experiência na área, por meio do acompanhamento do paciente.

Dr. Marcelo explica que, além disso, o médico deve realizar diversos testes para diferenciar esse de outros transtornos mentais, e até mesmo de doenças orgânicas. “O tempo de diagnóstico depende de cada pessoa, sendo que é preciso entender que pode haver casos mais típicos que outros, além de considerar a assistência médica que essa pessoa recebe”, explica.

O professor Raffael comenta que o diagnóstico da doença tem uma incidência entre 0,6% a 1% da população. Ou seja, não muito comum, mas não é considerada rara. “A identificação do transtorno começa no adulto jovem, sendo no homem entre os 18 e 24 anos, e na mulher entre os 22 e 27”, explica.

Mas isso leva tempo, como explica Raffael. “Além do prejuízo funcional, você precisa perceber pelo menos seis meses com sintomas psicóticos leves ou com sintomas residuais. Não é um diagnóstico considerado tardio, mas existe uma certa demora porque precisa ser feito a longo prazo, pois não adianta dizer que todo paciente com sintomas delirantes ou alucinatórios tem esquizofrenia”, esclarece.

Procedimento do exame na pesquisa

Dr. Marcelo explica que o processo de identificação da sua pesquisa foi feito por meio da Tomografia de Coerência Óptica (TCO), que não é uma tomografia clássica que utiliza radiação, e sim um laser. “O paciente se senta em frente ao aparelho de TCO com o queixo e testa apoiados e foca o olhar em um ponto de luz do aparelho (um olho por vez)”, detalha.

Os cientistas já finalizaram a pesquisa, que ocorreu com 35 pacientes saudáveis, além de outros 35 de controle, que são importantes para a validação metodológica. mas ainda não é possível diagnosticar a esquizofrenia apenas com esse exame, porque a história do paciente é essencial nesse processo. Mesmo assim, já se abrem novos caminhos para um diagnóstico mais rápido e certeiro. Os olhos poderão ser mais uma fonte para conseguir perceber como o cérebro atua.

O estudo foi publicado em uma revista internacional e o texto original, em inglês, pode ser lido na National Library of Medicine.

A matéria completa e o link do artigo estão disponíveis no site da AE: agenciaescola.ufpr.br

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