Em acórdão publicado no dia 4 de maio, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) decidiu que Adélio Bispo de Oliveira, autor do atentado contra o então candidato à presidência da República Jair Messias Bolsonaro, não pode responder a procedimento administrativo disciplinar de caráter punitivo enquanto estiver cumprindo a medida de segurança na Penitenciária Federal de Campo Grande (MS). A decisão segue entendimento do Ministério Público Federal (MPF).
Adélio foi considerado inimputável por sofrer de transtorno mental delirante persistente, sendo-lhe aplicada a medida de segurança de internação por prazo indeterminado, enquanto não for verificada a cessação da periculosidade, o que deve ser constatado por meio de perícia médica. Pela ausência de vagas no Hospital Psiquiátrico Judiciário Jorge Vaz, o único de Minas Gerais, a Justiça determinou seu encaminhamento à Penitenciária de Campo Grande, unidade federal que conta com Unidade Básica de Saúde e atendimento de médicos, inclusive psiquiatras, estrutura que vem atendendo Adélio.
Em outubro de 2019, a administração da penitenciária instaurou Procedimento Disciplinar Interno (PDI) para apurar eventual responsabilidade de Adélio em episódio em que ele se recusou a cumprir ordens dos agentes penitenciários, agredindo-os por gestos e xingamentos. A Defensoria Pública da União então ajuizou a ação, em que questiona se é possível submeter Adélio a sanções punitivas desta natureza, uma vez que ele foi considerado inimputável pelo atentado de 2018.
O caso chegou ao TRF3 por Remessa Necessária após a Justiça Federal de primeira instância extinguir o procedimento disciplinar e determinar que, enquanto estiver cumprindo medida de segurança, Adélio não pode ser autuado por qualquer tipo de sanção disciplinar de caráter punitivo, “salvo se voltado para o tratamento da sua doença mental, devidamente atestada e solicitada por profissional de saúde especializado”.
A procuradora regional da República Janice Ascari concordou em parte com a sentença. Em seu parecer, ela lembra que sanções disciplinares são destinadas exclusivamente aos condenados à pena privativa de liberdade, restritiva de direitos e ao preso provisório. Nenhuma destas situações se aplica ao caso de Adélio Bispo. “Se na data daquele fato Adélio não foi capaz de entender o caráter ilícito de uma tentativa de homicídio contra o então candidato à presidência da República, não é admissível que poderia, no momento atual, compreender o caráter transgressor de comportamentos inadequados que constituem infrações disciplinares, sem tratamento específico para sua patologia”.
No entanto, a procuradora considera que não se deve proibir que as autoridades penitenciárias possam aplicar outras medidas, não-punitivas, para conter Adélio em casos em que ele possa se mostrar violento. “Impedir que a autoridade impetrada tome medidas disciplinares neste momento resultaria num temerário salvo conduto para que o reeducando pudesse agir sem filtros, ou que atentasse contra a integridade física de outros detentos e funcionários”, argumentou.
Para ela, a solução que melhor se aplica à situação peculiar de Adélio é aquela que prevê a proibição de sanções administrativas, mas admite que, se for preciso, seja decretada medida cautelar de isolamento para contenção até que o tratamento seja assumido por profissional de saúde. Desta forma, conclui, equilibra-se “o direito do recluso de não ser submetido a regime disciplinar não previsto para medida de segurança e, ao mesmo tempo, garante ao diretor do presídio meios para que faça valer a garantia da ordem e, principalmente, a integridade física do interno, dos servidores e dos demais custodiados”.
O desembargador Fausto De Sanctis seguiu o entendimento do MPF. Para ele, é impossível indicar como sujeito ativo de uma infração disciplinar um indivíduo que foi absolvido impropriamente e para o qual houve a imposição do cumprimento de medida de segurança. “Não haveria qualquer sentido em aplicar a uma pessoa, (…) uma sanção com caráter eminentemente punitivo-retributivo se ela sequer tinha condições de entender que cometeu uma infração penal à luz da doença mental que a acometia”, constatou.
Em seu voto, De Sanctis advertiu que deve ser assegurada a possibilidade de que os agentes penitenciários possam agir para debelar situações de risco até que equipe médica que poderá melhor administrar a situação chegue ao local.
O caso foi julgado pela 11ª Turma do TRF3 que, por unanimidade, confirmou que Adélio Bispo não pode ser submetido a sanções disciplinares punitivas, mas permitiu que os agentes da Penitenciária Federal de Campo Grande possam agir para conter algum surto psicótico ou psicomotor.
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