Economia

RN é destaque na produção eólica e evidencia potencial em energia solar

Só no RN, estão instalados 193 parques eólicos e a capacidade produtiva é de cerca de 6 gigawatts (GW)

por: NOVO Notícias

Publicado 22 de dezembro de 2021 às 11:58

RN tem capacidade produtiva de cerca de 6 GW - Foto: ENBR3

RN tem capacidade produtiva de cerca de 6 GW – Foto: ENBR3

Para quem visita o Rio Grande do Norte, o encontro com as turbinas eólicas é quase inevitável. Mas muito além de elementos da paisagem potiguar, elas são responsáveis por liderar  a produção de energia eólica no Brasil, que apresenta 10% dessa fonte em sua matriz energética. Só no RN, estão instalados 193 parques eólicos e a capacidade produtiva é de cerca de 6 gigawatts (GW). Por ser limpa e renovável, a força dos ventos favorece a diminuição dos gases de efeito estufa (GEE) e as consequências irreversíveis do aquecimento global. O mesmo acontece com a energia solar, que conta com sistemas fotovoltaicos em 56,3% das cidades do estado.

No processo de identificação desse potencial, a verificação da disponibilidade de fontes renováveis em cada região é fundamental. David Mendes, doutor em Física da Atmosfera e professor do Departamento de Ciências Atmosféricas e Climáticas da UFRN (DCAC), explica que, no caso do RN, a produção eólica é possibilitada pela velocidade constante dos seus ventos, ainda que apresente picos em determinados períodos do ano. Essa característica permite que o potencial dessa fonte possa ser calculado e captado com mais facilidade para geração de energia. “O vento que sopra, por exemplo, em janeiro, é um vento que vai soprar, particularmente, em termos de velocidade, no mês de abril”, esclarece.

Com a energia solar, que perpassa toda a região Nordeste, não é diferente. A pouca presença de nuvens permite que os raios solares sejam resgatados e utilizados como meio energético no estado potiguar. David observa que isso é possível porque locais com muitas nuvens impedem que a radiação alcance a superfície e, posteriormente, seja captada. “Quando temos uma região com pouca nebulosidade, poucas nuvens, ela é mais propícia e, geralmente, na região equatorial da Terra (caracterizada pela baixa latitude e temperatura média de 27 °C), nós temos uma constância na radiação solar ao longo do ano”.

Apesar de essenciais, os recursos naturais não trabalham sozinhos na produção de fontes alternativas. Pelo contrário, essa atividade abrange diferentes etapas da produção científica e depende da mão de obra humana para avançar. Entre as ciências que fundamentam essa trajetória, está a meteorologia. Se no conceito ela está no campo do estudo da atmosfera, na prática seu papel é identificar potenciais energéticos e participar do planejamento de parques eólicos e solares. “É por meio de um estudo feito dentro da academia ou por empresas particulares que o meteorologista consegue identificar exatamente qual é a melhor área de captação – de onde você vai tirar o máximo daquela captação, seja do vento, seja da radiação solar”, ressalta David.

RN puxa recorde do Brasil

O Brasil registrou este ano o maior incremento da história em capacidade instalada de energia eólica e o Rio Grande do Norte o maior produtor desse tipo de energia no país. O estado foi o que mais puxou esse crescimento, segundo a Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica) a partir de dados consolidados pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). O levantamento mostra que, até novembro de 2021, foram instalados mais de 3 Gigawatts (GW) em energia eólica e que a participação potiguar nesse total chegou a 44,19%, ou a 1,35 GW. Na sequência do ranking aparecem Bahia, com contribuição de 818,40 MW, ou uma fatia de 26,79%, Ceará (10,03%), Paraíba e Piauí.

Com a adição dos 3 GW, “o maior incremento na capacidade instalada de fonte eólica da história”, segundo a Aneel, a potência instalada da “energia dos ventos” no país alcançou 20,1 GW, o que representa participação de 11,11% das eólicas na matriz energética brasileira.

“Esse é um crescimento extremamente importante, que começou lá atrás, derivado do potencial gigantesco que o Brasil tem, e com uma importância especial do ponto de vista do desenvolvimento, porque é a partir dele que são geradas oportunidades de qualificação de pessoas e de entrada de pessoas no mercado de trabalho dessa indústria”, observou Rodrigo Mello, diretor do Instituto Senai de Inovação em Energias Renováveis (ISI-ER) e do Centro de Tecnologias do Gás e Energias Renováveis (CTGAS-ER), unidades do Senai Rio Grande do Norte que atuam nas áreas de educação profissional, pesquisa, desenvolvimento e inovação – e que são referências do Senai no Brasil nessas áreas.

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Atrelada a essa evolução, complementa ele, muita riqueza também será gerada do ponto de vista tecnológico e de desenvolvimento de conhecimento. “Um setor que possui hoje uma capacidade instalada de 20,1 GW (no Brasil), já tem contratado para entrar em operação até 2026 mais 12,9 GW. Ou seja, eu já tenho certeza de que haverá um crescimento de 65% desse setor nos próximos cinco anos e isso requer uma evolução tecnológica que gera provocação das universidades, dos institutos de ciência e tecnologia, como o nosso, e o Rio Grande do Norte é destaque nacional nesse campo”.

Hoje, o Rio Grande do Norte representa cerca de 30% da geração eólica nacional, conta com cerca de 6 GW instalados e tem mais a caminho. “Já temos previstos para entrar em operação nos próximos cinco anos mais 4,3 GW de energia, ou seja, 70% a mais de tudo o que a gente construiu até hoje, então vamos entrar em uma lógica de recorde sobre recorde”, estimou ainda o diretor do ISI-ER e do CTGAS-ER.

O presidente da Federação das Indústrias do Rio Grande do Norte (Fiern) e do Conselho Regional do Senai-RN, Amaro Sales de Araújo, fez coro, ressaltando que o estado “caminha para ser reconhecido internacionalmente como locomotiva das energias no Brasil, não só no campo eólico”. “Na energia solar e, em breve, no hidrogênio verde também”, observou.

Ele destacou ainda o salto previsto na geração potiguar – e do Brasil – com as perspectivas que se abrem no setor offshore, a geração de energia eólica a partir de turbinas instaladas no mar – que tem os primeiros projetos à espera de licenciamento no Ibama.

“O RN, com sua capacidade futura de produção de 140 GW, é a solução para o problema da crise energética”, enfatizou Sales. “É o Nordeste produzindo energia para o Brasil, neste momento tão difícil para o setor nacionalmente. Mais uma prova de que o Nordeste não é problema, é solução para o país”.

Para Elbia Gannoum, presidente executiva da ABEEólica, a tendência de crescimento do setor não é apenas necessária, mas irreversível diante da emergência climática mundial que existe. “Temos uma emergência climática para resolver e as instalações de energias renováveis precisam se expandir como uma das ferramentas imprescindíveis nessa luta”, destacou em nota sobre a avaliação do cenário apresentado nos dados da Aneel.

O crescimento recorde de instalações de energia eólica, na sua análise, “é fruto do trabalho de uma indústria sólida e que tem se expandido de maneira consistente nos últimos 12 anos”. “É também reflexo de um grande crescimento do mercado livre para as eólicas. Desde 2018, estamos vendendo mais no mercado livre que nos leilões do regulado, consequência de uma abertura maior do mercado e também do crescimento da conscientização das empresas sobre a importância de se consumir energias renováveis”.

Investimentos e previsões

Independente dos eventos climáticos, David Mendes enxerga que o incentivo às fontes solar e eólica é uma necessidade no Brasil. Isso fica mais evidente ao analisar o déficit de chuvas enfrentado no Sul e Sudeste do país, sobretudo no período de junho a setembro deste ano. A consequência da crise hídrica é o baixo nível da água nos reservatórios hidrelétricos e o apelo à utilização das fontes termelétricas, que se baseiam no uso de materiais não renováveis e emitem dióxido de carbono na atmosfera. “Estima-se que a gente possa ter, nos próximos meses, um período muito crítico de água e de geração de energia, em razão justamente dessa falta de chuva”, adverte o professor.

Ele observa que os investimentos não precisam ser em grande escala e podem ter início na inserção da energia do sol e dos ventos em territórios habitados por  pequenas populações. “Se mais investimentos nós tivermos em relação ao tipo de energia alternativa – dando não só aos grandes municípios parques eólicos maiores, mas também às pequenas comunidades, tanto na captação de energia solar quanto do vento –, a gente vai diminuir a utilização desses recursos que nós temos hoje, que são os recursos hidrelétricos. Consequentemente, a gente não vai saturar o mercado”, comenta.

Fora os  incentivos fiscais por parte dos governos municipais, David acredita que é preciso conscientizar as empresas de energia nacionais a investir em fontes alternativas. Hoje, esse setor é caro, mas com a massificação dos parques eólicos e captação de energia solar é possível aumentar a demanda e diminuir os custos. A partir disso, populações localizadas em regiões carentes de energia, como é o caso dos pequenos agricultores e pecuaristas, podem ser beneficiadas. “O Brasil vem avançando muito nisso, mas ainda é muito pequeno se nós compararmos a outros países, principalmente países europeus, nos quais esse tipo de incentivo é cada vez mais presente na sociedade”, reconhece.

Um exemplo disso é a restrição de carros mais antigos e o estímulo à compra de automóveis mais ecológicos. Essas ações já são executadas na Europa e nos EUA e favorecem a menor liberação de gases do efeito estufa (GEE) na atmosfera e o desenvolvimento de um mundo mais sustentável. Para David, essas opções e a oferta de transportes públicos eficientes são essenciais no enfrentamento das consequências do clima. “Um serviço de transporte eficaz diminui a quantidade de carros. Isso aí é factual, ou seja, é uma coisa que a gente já viu e já identificou”, defende.

Outra possibilidade é o emprego de energias alternativas em grandes regiões, condomínios e indústrias. Não se trata da substituição total da energia elétrica consumida nesses espaços, mas de pequenas mudanças, como a implementação de placas solares que possam reduzir as fontes energéticas convencionais. “Só para ter ideia, toda a energia que nós temos hoje no Brasil gera um custo muito alto não só para quem produz energia (empresas), como também para quem consome. Esse consumidor vai desde o grande industrial até o pequeno”, enfatiza David.

O docente continua explicando que a sociedade brasileira paga uma das energias mais caras do mundo, o que exige a presença de  alternativas energéticas que estimulem a eficiência ecológica e a redução das bandeiras de energia. Além disso, os preços elevados causam prejuízos para as indústrias do setor energético, que deixam de produzir em larga escala ou aumentam diretamente o preço final dos seus produtos. O reflexo desse problema é um panorama totalmente contrário ao conceito da sustentabilidade.

Em relação ao futuro energético do RN e do mundo, David retoma o papel do meteorologista. Responsáveis por analisar a instabilidade do clima e vislumbrar os próximos cenários, esses profissionais já começam seu trabalho no ensino  superior e são peças-chave na construção de relatórios como o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). “Então eu posso dizer que sem a meteorologia, sem o meteorologista, você não consegue identificar parques de captação de energias renováveis. O profissional meteorologista se faz cada vez mais importante e mais presente dentro desse tipo de contexto”, conclui o professor.

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