Após quatro anos de discussões, a minuta do Plano Diretor de Natal foi finalizada e está desde a última quinta-feira (17) nas mãos da Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo (Semurb). A expectativa é de que o projeto de revisão do plano chegue à Câmara Municipal de Natal até o início do próximo mês. Com isso, os vereadores começam a definir as novas regras para ocupação do solo e desenvolvimento urbano da capital potiguar.
O texto final do Plano Diretor foi apreciado esta semana, entre os dias 14 e 16, pela Conferência Final do Conselho da Cidade do Natal (Concidade). O órgão colegiado é formado por integrantes da gestão municipal, órgãos de controle, organizações sociais, entidades de classe, instituições de ensino e representantes da sociedade civil organizada.
As novas regras do Plano Diretor prometem, entre outras coisas, modernizar as atividades e resolver problemas do desenvolvimento urbano, como o déficit habitacional, o adensamento populacional, a recuperação de áreas degradadas, regularização fundiária e até melhorias nos serviços públicos de saneamento e mobilidades.
Nos últimos dias, a Conferência Final do Concidade deliberou a versão final da revisão da Lei Complementar 082, de 21 junho de 2007, que norteiam o atual Plano Diretor de Natal. O vice-presidente do Concidade, Albert Josuá Neto, aponta que este é um dos últimos momentos de discussão do Plano Diretor. As discussões foram iniciadas em 2017, passou por diversas suspensões, mas ganharam fôlego em 2019.
Agora, o texto final será encaminhado para a Procuradoria Geral do Município (PGM), que dará formato jurídico adequado do texto, e enviará a revisão do projeto de lei para a Câmara Municipal de Natal. A estimativa é de que o texto passe a ser analisado pelos vereadores num prazo de uns 8 a 10 dias.
“Muitas mudanças foram propostas durante o processo de revisão. Altura máxima de prédios passando de 90 metros para 140 metros, construção no entorno das dunas, coeficiente de aproveitamento dos lotes, entre outros assuntos”, diz.
Uma das principais mudanças é modificar as restrições para construções imobiliárias em Natal. A meta é aumentar os espaços considerados como “zonas adensáveis”. No atual Plano Diretor, apenas 16 dos 36 bairros são considerados adensáveis. O coeficiente básico proposto é de 1,0 para toda a cidade, podendo chegar a máximos de 1,5 a 5,0, dependendo do bairro que se encontra no terreno.
Com a mudança, Natal passará a ter elevação nos valores de gabaritos de construção — o limite de altura para os edifícios. Na minuta, para as áreas mais adensadas, a altura máxima dos prédios passa a ser de 140 metros. Hoje, no plano em vigor, a altura é de 90 metros para áreas mais adensáveis.
Uma das áreas que poderão ser beneficiadas com a mudança é o bairro da Redinha, na Zona Norte da capital. A área poderá, no futuro, receber imóveis de até 10 pavimentos. Porém, a limitação será definida pela análise do documento na Câmara Municipal de Natal. Isso pode ocorrer em razão da melhoria da infraestrutura do bairro, como é o caso da Estação de Tratamento de Esgotos (ETE) Jaguaribe, que deve ser concluída ainda este ano. A estrutura necessária para tratar 1.050 litros de esgoto por segundo, o suficiente para atender mais de 600 mil pessoas, é mais do que o dobro da população estimada da zona Norte de Natal.
Gabarito de 140 metros
Segundo Sophia Motta, diretora do Instituto Arquitetos do Brasil (IAB) e participante do Conselho Municipal de Planejamento Urbano e Meio Ambiente (Conplam), o atual plano diretor vigente, de 2007, tem o menor coeficiente de aproveitamento da cidade, trazendo como resultado uma diminuição da população da área adensável da cidade. O atual limite de gabarito é de 90 metros de altura, cerca de 30 pavimentos. Com a modernização, os prédios poderão chegar a até 140 metros, cerca de 43 pavimentos.
“Minha visão é que tanto o aumento de coeficiente como o aumento do gabarito são importantes pra cidade e estão de acordo com a nova agenda urbana da Organização das Nações Unidas (ONU), que propõe diretrizes para o desenvolvimentos sustentável dos centros urbanos para os próximos vinte anos. A nova agenda urbana propõe cidades mais adensadas e menos espalhadas”, detalha.
Para o professor Rubens Ramos, titular do curso de Engenharia Civil da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), o aumento do adensamento é um “bom” caminho para transformar a função social da área. Segundo ele, o aumento permite maior número de famílias morando no mesmo terreno, reduz o espaço solo ocupado e será mais econômico, com menor custo de infraestrutura e gastos de transportes.
Entretanto, ele tem restrições ao modelo que foi aprovado pelo Concidade. Para Rubens Ramos, a proposta do Concidade é insuficiente e o modelo de adensamento por bacias de saneamento é “esdrúxulo”. “Coloca a carroça na frente dos bois, o rabo do cachorro puxando o cachorro. Há propostas a serem votadas que alteram a minuta original propondo maior adensamento nos principais eixos da cidade, independente das bacias de saneamento, e com valores que podem realmente fazer a diferença”, critica.
Segundo ele, que também acompanha a votação da minuta final, a proposta vinda do Concidade, tem trechos da Avenida Salgado Filho que poderão ficar com coeficiente de aproveitamento menores do que os atuais. “As áreas da Cidade Alta, Ribeira e Alecrim ficam sem chance de serem renovadas. Uma proposta que fiz foi aumentar os coeficientes para parâmetros que realmente fazem a diferença e viabilizam redesenvolver a cidade, como 7,0 para Avenidas Salgado Filho, Hermes da Fonseca, Prudente de Morais, Bernardo Vieira, Roberto Freire, abrangendo os bairros da Cidade Alta, Alecrim e Ribeira”, aponta.
Eixo estruturantes
Outra mudança do novo Plano Diretor é com relação ao conceito de Eixos Estruturantes. O objetivo é incentivar o adensamento nos corredores com infraestrutura urbana adequada, como rede de esgotamento sanitário, drenagem, pavimentação e escolas.
A possibilidade de se construir em um lote (coeficiente de aproveitamento) leva em consideração a localização do imóvel e a relação desse imóvel com o sistema de esgotamento sanitário da cidade (bacia de esgotamento). Leva em consideração, também, a proximidade do imóvel com os chamados “Eixos Estruturantes” (que são ruas/avenidas, indicadas na minuta).
A proximidade de um imóvel com determinado “Eixo Estruturante” pode aumentar em até 4 (quatro) vezes o potencial construtivo deste imóvel. Como exemplo, podem ser citados os casos de imóveis que ficam nas proximidades da Av. Roberto Freire e da Av. João Medeiros Filho.
Na visão de Sophia Motta, os eixos estruturantes vêm como uma maneira de levar o desenvolvimento urbanos para onde passar o transporte público da cidades. “Sim, de fato com os eixos estruturantes teremos mais possibilidade de levar habitação e uso misto para as principais avenidas da cidade como a Bernardo Vieira, Avenida Conselheiro Tristão, Avenida João Medeiros Filho, por exemplo”, define.
Rubens Ramos complementa dizendo que a ideia de eixos estruturantes é fazer a cidade crescer ao longo de suas principais vias, em vez de crescer na periferia ou no interior dos bairros, como tem acontecido. “É a vez de Natal. A questão das áreas degradadas passa por outra estratégia, que a meu ver seria de selecionar uma região (como Cidade Alta, Ribeira, Alecrim, Santos Reis, Praia do Meio) e permitir a verticalização com coeficiente de aproveitamento mais alto, sujeito a definições do que se quer, p.ex., um generoso afastamento entre prédios. O que não se pode esperar é que o investidor vá colocar seus recursos onde não haverá resultado. Sem retorno do investimento, a degradação vai aumentar, como está acontecendo”, explana.
Vale lembrar, ainda, que o novo Plano Diretor também tem a finalidade de estimular o uso misto dos imóveis. A tendência é permitir que as construtoras destinem parte das construções para uso não-residencial. A expectativa é que, no futuro, os imóveis possam combinar residência com escritórios, hotel, consultório e lojas, por exemplo.
Operações Urbanas
O novo Plano Diretor também deve autorizar a adoção do mecanismo das “operações urbanas consorciadas”. O sistema consiste em parcerias público-privadas a partir das quais empresas investiriam na melhoria da infraestrutura da cidade em troca do aval para construções maiores, por exemplo. Os limites para construção seriam definidos caso a caso.
Cada operação urbana consorciada terá regras bem definidas (a partir de editais públicos, por exemplo). Os empreendimentos também não poderão se sobrepor à atual legislação municipal vigente atualmente. O que poderão ser feitas são adequações para solucionar conflitos.
Para a arquiteta Sophia Motta, as operações urbanas consorciadas já estão previstas no plano diretor vigente desde 1994. “Hoje, a minuta em votação já aplica para todo o território do município como passível de operação urbana consorciada. Além disso, tem uma proposta por parte dos segmentos acadêmicos de um um novo instrumento, que vem sendo adotado por várias cidades brasileiras como São Paulo e Salvador, que são os Projetos Urbanos Locais (PUL). O PUL é uma espécie de Operações Urbanas Consorciadas de pequeno porte, de iniciativa tanto do poder público como da sociedade”, disse.
O modelo não agrada o professor Rubens Ramos. Ele diz que o investidor privado ficará dependendo do gestor público. “Isso não tem dado certo em nenhum lugar. O que tem que se fazer é algo mais simples: permitir construir com coeficientes de aproveitamento mais alto. Se houver a possibilidade de construir e a premiação para quem quiser fazer algo mais pela cidade, a cidade será positivamente transformada. Se ficar para o gestor público gerenciar o processo, não vai dar em nada”, explica.
Áreas Especiais de Interesse Turístico e Paisagístico
Um melhor uso para a região da Via Costeira também é uma das metas do novo plano diretor. A área — corredor hoteleiro da capital potiguar — carece de investimentos e de um novo planejamento estratégico. Nos últimos cinco anos, dois empreendimentos hoteleiros fecharam as portas na região: Pirâmide e Parque da Costeira.
O novo Plano Diretor projeta transformar a Via Costeira, hoje incluída em uma Zona Especial de Interesse Turístico (ZET), em uma Área Especial de Interesse Turístico e Paisagístico. Com isso, haverá a instalação de empreendimentos de uso misto para o favorecimento do turismo local e o investimento dos pequenos e médios empreendimentos.
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