A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomendou uma investigação aprofundada sobre a hipótese de a covid-19 ter tido origem em um acidente de laboratório no Instituto de Virologia de Wuhan, na China, onde os primeiros casos da doença foram diagnosticados, no fim de 2019. Há um ano, a possibilidade foi considerada “extremamente improvável”.
O posicionamento foi tomado após críticos terem acusado a OMS de descartar, com demasiada rapidez, ou subestimar a teoria de que o vírus pode ter tido origem laboratorial.
Muitos cientistas defenderam ser mais provável que o novo coronavírus tenha sido transmitido a humanos a partir de morcegos, possivelmente com outro animal como intermediário.
No entanto, em relatório divulgado nessa quinta-feira (9), o grupo de especialistas da OMS disse que faltam ainda “dados-chave” para apurar como a pandemia de covid-19 começou.
Os cientistas disseram que “permanecerão abertos a toda e qualquer evidência científica que se torne disponível no futuro, para permitir testes abrangentes de todas as hipóteses razoáveis”.
Observaram que, como os acidentes de laboratório no passado provocaram alguns surtos, a teoria, que foi altamente politizada, não pode ser descartada.
Identificar a fonte de uma doença pode levar anos. Demorou mais de uma década para os cientistas identificarem as espécies de morcegos que serviram como reservatório natural da síndrome respiratória aguda grave (SARS), outro coronavírus, detectado no Sul da China, no fim de 2002.
O virologista Jean-Claude Manuguerra, do grupo da OMS que investiga a origem da covid-19, reconheceu que alguns cientistas “podem ser avessos” à ideia de investigar a teoria do laboratório, mas que é preciso manter a “mente aberta” para examinar essa hipótese.
O relatório pode reacender acusações de que a OMS aceitou inicialmente, sem questionar, as explicações do governo chinês, no início do surto em Wuhan.
Alguns dos principais membros da OMS ficaram frustrados com a China durante o surto inicial, mesmo depois de a agência da ONU ter elogiado o presidente chinês, Xi Jinping. Também ficaram frustrados pela forma como a China procurou restringir a pesquisa sobre as origens da pandemia.
O ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump especulou repetidamente – sem qualquer evidência – que a covid-19 seria originária de um laboratório chinês, e acusou a OMS “de conluio” com a China para encobrir o surto inicial.
Especialistas, citados pela agência de notícias Associated Press, disseram que nenhum estudo foi fornecido à OMS que avaliasse a possibilidade de a covid-19 ter resultado de uma fuga de um laboratório.
Jamie Metzl, que integra grupo consultivo da OMS não relacionado com as investigações, sugeriu que os países do G7 criassem equipe própria para pesquisar as origens do vírus, alegando que a organização não tem autoridade política, experiência e independência para realizar uma avaliação tão crítica.
Metzl saudou o pedido da OMS para uma investigação mais aprofundada sobre a teoria do laboratório, mas disse ser insuficiente: “O governo chinês se recusa ainda a partilhar dados brutos essenciais e não permite uma auditoria completa e necessária dos laboratórios de Wuhan”.
O grupo de cientistas da OMS encarregados de investigar a origem do coronavírus disse serem necessárias várias abordagens, incluindo estudos que avaliam o papel de animais selvagens, e estudos ambientais em locais onde o vírus pode ter se alastrado pela primeira vez, como o mercado de frutos do mar de Huanan, em Wuhan.
Em março de 2021, a OMS divulgou relatório sobre as origens da covid-19, depois de uma visita de cientistas internacionais à China. O relatório concluiu que a doença provavelmente passou de morcegos para humanos, e que não havia provas que sugerissem a origem em laboratório.
No entanto, depois de críticas feitas pela comunidade científica, incluindo alguns pesquisadores da OMS, o diretor da agência reconheceu que era prematuro descartar a hipótese.
Pequim criticou, nesta sexta (10), a teoria de que a pandemia de covid-19 pode ter tido origem num laboratório chinês como uma “mentira politicamente motivada”, depois de a Organização Mundial da Saúde (OMS) ter recomendado uma investigação aprofundada.
O porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros Zhao Lijian também rejeitou as acusações de que a China não terá cooperado totalmente com os investigadores da OMS, que viajaram para o país, no ano passado.
O porta-voz disse que a China está recetiva a uma investigação baseada na ciência, mas que rejeita qualquer manipulação política.
Ele também reiterou os apelos para uma investigação nos “laboratórios [norte-americanos] altamente suspeitos, como Fort Detrick e a Universidade da Carolina do Norte”, onde a China sugeriu, sem evidências, que os Estados Unidos estavam a desenvolver o novo coronavírus, como uma arma biológica.
“A teoria de que o [coronavírus] vazou a partir de um laboratório é uma mentira completa, inventada por forças anti–China, para fins políticos, que não tem nada a ver com a ciência”, apontou Zhao, em conferência de imprensa.
O porta-voz disse que a China fez grandes contribuições para as pesquisas sobre a origem do vírus, compartilhando a maioria dos dados e resultados das suas próprias investigações.
Isto “reflete totalmente a atitude aberta, transparente e responsável da China, bem como o seu apoio ao trabalho da OMS”, disse.
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