Pollyanna Fernandes tem 38 anos e já sonha há algum tempo em fazer a laqueadura, um procedimento cirúrgico que consiste na ligadura ou obstrução das trompas como forma de contracepção permanente. A técnica em enfermagem, que reside em Mossoró, até teve vontade de ter filhos quando era bem jovem, mas desistiu com o passar do tempo. “Quando a gente cresce, percebe que a realidade é outra. Então, com o passar dos anos, fui mudando de ideia”, contou.
Mesmo com o desejo de realizar a laqueadura, Pollyanna não possuía autorização para tal, pois é solteira e não possui filhos. Antes, a legislação só permitia a realização do procedimento em mulheres que tivessem, pelo menos, dois filhos vivos, além do consentimento do parceiro. Agora, uma nova lei, já em vigor desde o início deste mês de março, permite que mulheres a partir dos 21 anos, sem filhos, sejam submetidas à laqueadura.
Homens da mesma idade também podem fazer à vasectomia. “Se a pessoa não tem filhos, mas é maior de 21 anos e capaz de praticar atos da vida civil, pode optar pelo procedimento. Da mesma forma pode-se aplicar o mesmo entendimento para quem não tenha completado 21 anos, mas já possua pelo menos dois filhos”, explica a advogada Andrea Medeiros.
Além disso, não é mais necessário o consentimento de um companheiro para a realização da esterilização voluntária. As mudanças na legislação deixaram a Pollyanna esperançosa. “Eu achei que não seria possível. Agora vou ver se consigo fazer”, contou.
Assim como Pollyanna, a sapateira Dyva Dantas também tem o desejo de fazer a laqueadura. Antes da mudança na lei, a caicoense também não poderia fazer o procedimento pois é solteira e só tem uma filha. Ao ver que agora poderia ser submetida à cirurgia, ela procurou o médico. No entanto, encontrou resistência. “Ele disse que não fazia [a cirurgia], porque, segundo ele, tem várias mulheres que se separam do marido, depois voltam, se arrependem do procedimento e colocam o médico na Justiça. Aí eu vou procurar uma ginecologista em Natal para fazer”, informou.
“Se a sociedade muda o direito, também tem o dever de evoluir. Afinal, estamos falando de progressos relacionados à autonomia da mulher no tocante à sua vida reprodutiva (…). Embora o direito ao planejamento familiar pertença ao casal, o direito ao próprio corpo não é compartilhado. É pessoal e intransmissível”, opina Andrea Medeiros.
Outra inovação da lei é a permissão para fazer a laqueadura durante o parto, o que não era permitido na legislação anterior. Para isso, a mulher deve solicitar o procedimento com 60 dias de antecedência. “A paciente, juntamente com o médico responsável pelo pré-natal, tem que assinar um termo, pelo menos, 60 dias antes do parto. O documento serve para deixar registrado que a paciente manifestou o desejo de realizar a laqueadura”, explicou a ginecologista Thamara Oliveira. Ao solicitar a cirurgia por escrito, a pessoa interessada receberá orientações sobre as vantagens, desvantagens, riscos e eficácia do procedimento.
Para a senadora potiguar Zenaide Maia (PSD), que também é médica, a medida favorece a mãe e gera economia ao Sistema Único de Saúde (SUS). “Sai muito mais econômico preparar a equipe que já vai fazer o parto e também fazer a laqueadura na mulher. E é melhor, inclusive, para a mãe. Como médica, eu vi muita mãe ter que voltar depois de 45 dias para poder fazer [a laqueadura]. Aí elas têm que deixar o bebê, que normalmente ela amamenta, para se submeter a outra cirurgia”, relatou.
A recente mudança na legislação ainda não causou tanto impacto nos consultórios, de acordo com a ginecologista Thamara Oliveira. “Ainda não houve um aumento significativo no número de pedidos pela esterilização. Acredito que, com acesso à informação, o número de procedimentos possa aumentar. Eu percebo que a população ainda desconhece os métodos que podem ter acesso e isso dificulta o processo”, disse a médica.
A cirurgia de laqueadura, assim como todo procedimento cirúrgico, tem riscos. “O método não é 100% seguro. Existe uma taxa de falha de 0,41%, que independe do paciente ou técnica cirúrgica”, revelou Thamara Oliveira.
Embora a legislação seja clara, em alguns casos pode acontecer a negativa do plano de saúde para a realização do procedimento. No entanto, de acordo com a advogada Andrea Medeiros, o consumidor, no caso, o paciente tem o direito de contestar. “Se a recusa for injustificada ou não fundamentada, pode ser indevida. Nessa situação, o beneficiário pode registrar queixas na plataforma consumidor.gov, na ANS, no Procon do seu Estado ou procurar um advogado especializado para orientá-lo em uma possível ação”, explicou.
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