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Depressão: a dor da alma

NOVO Notícias conversou com pessoas em diferentes partes de Natal que foram diagnosticadas e que convivem com a depressão; capital potiguar é a segunda do Nordeste com maior número de adultos com a doença

por: NOVO Notícias

Publicado 2 de maio de 2022 às 16:00

Natal é a segunda capital do Nordeste com maior número de adultos com depressão – Foto: Instituto Santos Dumont (ISD)

Um emaranhado de sentimentos: pressão, tristeza, falta de energia para fazer qualquer coisa, e uma enorme dificuldade de lidar com as perdas. Um estado mental que nos leva a acreditar que não existe saída… mas existe. O NOVO Notícias conversou com pessoas em diferentes partes de Natal que foram diagnosticadas e que convivem com a depressão, a chamada “dor da alma”. A capital potiguar é a segunda do Nordeste com maior número de adultos portadores da doença.

Um levantamento inédito, publicado pelo Ministério da Saúde neste mês, coloca Natal como a segunda capital do Nordeste com o maior número de pessoas com 18 anos ou mais que relataram um diagnóstico médico por depressão. A capital potiguar contabiliza 11,8% de registros nessa parcela da população, atrás somente de Recife, com 12,5%, conforme dados tabulados pelo órgão ministerial através da Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel) – ano base 2021.

Os dados da Vigitel apontam ainda que entre o período pré-pandemia e o 1º trimestre de 2022, foi registrado um aumento de 41% no diagnóstico médico de depressão da população brasileira. A estudante de Direito, Anne Karoline Aquino, de 27 anos, contou que com a pandemia, nos últimos dois anos, a sua saúde mental foi diretamente afetada, mudando completamente os seus hábitos no cotidiano.

Anne Karoline, 27 anos, ex-fisioterapeuta e atual estudante de Direito, disse ter tido a saúde mental afetada durante a pandemia – Foto: Cedida

“A pandemia foi um fator de risco enorme para quem já sofria com doenças mentais. Com o seu decorrer de dois anos, quem conseguia manter um bem-estar mental com trabalho, estudo etc., viu tudo isso indo por água abaixo. Eu falo por mim, que era fisioterapeuta, trabalhava na área e fazia pós-graduação. Com a pandemia, minha depressão, que já existia, porém, estava em período silencioso, gritou. Me vi em casa sem afazeres, e principalmente sem ânimo para nada. Acabei desistindo da Fisioterapia, estou cursando Direito para ver se tenho um ânimo a mais na minha vida, que se tornou muito monótona e sem graça”, disse Anne.

Ainda segundo a Vigitel, entre as mulheres houve aumento de 39,3%. O diagnóstico da depressão no grupo feminino foi maior do que no masculino em ambos os períodos, tanto antes da pandemia como depois. Anne também relatou ao NOVO que realiza tratamento psiquiátrico há 4 anos, e que descobriu outras síndromes, durante o período pandêmico.

“Durante essa pandemia, o tratamento foi primordial, destacando minha depressão e diagnosticando a minha síndrome de bordeline, que foi diagnosticada após a pandemia. E eu posso falar com prioridade: eu era uma Anne Karoline antes da pandemia; eu sorria, eu saía com os amigos, eu era freguesia certa no crossfit, e depois da pandemia eu sou outra Anne Karoline, completamente diferente. Sorrir para mim hoje em dia é um trabalho difícil”, relatou Karoline.

Dificuldade para tratamento

Pacientes relatam dificuldades no tratamento em Centro de Atenção Psicossocial de Natal – Foto: Divulgação

A reportagem do NOVO Notícias também acompanhou o desafio da população para encontrar tratamento para transtornos como a depressão. Internada há mais de sete dias, no Centro de Atenção Psicossocial III (CAPS III), localizado na rua Mipibu, em Petrópolis, zona Leste de Natal, a estudante de enfermagem, Rayane Teixeira, de 22 anos, relatou sobre falta de estrutura e de psiquiatras para lidar com a doença.

“Os psicólogos do SUS não continuam o tratamento. Passei por cinco e tive que começar no particular. Onde estou internada, os profissionais estão em greve. Percebo que não é dada a assistência necessária para a área de atendimento psicológico. Faltam profissionais, falta incentivo aos profissionais, falta verba, falta atenção, falta conscientização da importância da saúde mental para o homem. E isso dificulta muito o acesso a quem realmente precisa desse serviço”, falou Rayane.

Rayane Teixeira, estudante de enfermagem – Foto: Cedida

A estudante também contou sobre a dificuldade de uma pessoa com depressão ter o tratamento adequado. Ela conta que alguns profissionais ainda enxergam um grande tabu na doença.

“O processo de internação foi um choque. Eu nunca imaginei que precisaria me internar. Eu tenho o olhar de profissional da saúde e de paciente. E eu consigo enxergar que por exemplo, uma das crises de ansiedade que tive uma enfermeira soube bem conduzir o caso. Em outra crise, com outra enfermeira, foi totalmente diferente. Até a medicação de urgência ela não teve agilidade de administrar. Muitos profissionais ainda têm o tabu de achar que ansiedade é frescura ou é só dizer “fique calma” e não sabem manejar de forma humana”, explicou Rayane.

Em nota, a Secretaria de Estado de Saúde Pública (Sesap) esclareceu que o fluxo de atendimento para saúde mental vem se modificando de forma humanizada e cuidadosa.

Ainda de acordo com a pasta, “o paciente pode ser atendido em qualquer serviço de pronto atendimento e referenciado para atendimento especializado quando necessário. Também existe a disponibilização de telemedicina com psiquiatras da rede estadual”, afirmou em nota.

Segundo a Sesap, atualmente existem, no Hospital João Machado, apenas na capital, cerca de 250 leitos de saúde mental na rede pública, sendo 80 deles nessa unidade de saúde, além das demais regiões.

“A melhor forma de atenção e cuidado à pessoa em sofrimento mental consiste na compreensão mais moderna do adoecimento, afastada do modelo baseado em internações prolongadas e medicalização isolada de outras práticas de promoção de saúde e vida. Reforça-se assim a necessidade de fortalecer os serviços de baixa e média complexidade para que a pessoa com doença mental tenha garantia de cuidado continuado e integral”, finalizou o órgão.

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