Tiago Machado e Louis Bellemare formam o primeiro casal de homens a conquistar o feito no estado – o primeiro era composto por duas mulheres. Fertilização in vitro foi realizada em São Luís do Maranhão após “má vontade e homofobia” em clínicas potiguares
Publicado 7 de março de 2022 às 15:30
O potiguar Tiago Machado, residente no Canadá desde 2001, tinha o sonho de ser pai. Em 2008, ele deu início ao processo de reprodução assistida para ter um filho. Por ser homoafetivo, a única técnica possível para ele seria a fertilização in vitro – quando o sêmen do homem é colhido e combinado com os óvulos de uma doadora.
Em 2017 Tiago conheceu o canadense Louis, que se uniu ao desejo do ‘head hunter’ (recrutador) de ser pai. No entanto, o casal relata ter encontrado muitas barreiras para conseguir realizar o sonho no Rio Grande do Norte – local onde Tiago escolheu para realizar o processo.
“Foi tudo feito de forma legal; afinal, tem a lei que nos ampara. Mas faltou boa vontade e teve a questão da homofobia nas clínicas aqui do estado. Todas criaram empecilhos para a não realização do procedimento”, relatou o brasileiro.
Cansados de tantos ‘nãos’, que, segundo o casal, não são dados com tanta frequência para casais heterossexuais, Tiago e Louis decidiram procurar uma clínica em outro estado.
“O Conselho Regional de Medicina me deixou no vácuo até hoje. Já são dois anos sem resposta sobre o nosso processo aqui no RN, o que fez com que a gente fosse realizar o procedimento em São Luís, no Maranhão. Lá encontramos uma clínica com profissionais excepcionais, que foram além de suas obrigações para ajudar e se adaptar a nossa situação, sem distinção de orientação sexual. Somos muito gratos a eles”, contou Tiago.
A técnica de Fertilização in Vitro (FIV) realizada por casais homoafetivos compostos por homens exige uma mulher que conceda temporariamente seu útero, como barriga solidária. De acordo com uma resolução publicada pelo Conselho Federal de Medicina em 2017, a barriga solidária deve ser de uma integrante da família de algum dos parceiros e deve ter parentesco consanguíneo de até quarto grau (mãe, irmã, tia, sobrinha, prima e avó), sem o envolvimento de fins lucrativos ou comerciais.
Uma prima de Tiago se dispôs a ajudar e aceitou participar do processo. Em 2021 ela foi até o Maranhão para que os embriões fossem transferidos para o seu útero e, com três meses de gestação, ela retornou para o Rio Grande do Norte.
No final da gestação, em 3 de fevereiro deste ano, Tiago e Louis desembarcaram em Natal. E no dia 14 do mesmo mês, aos 40 anos de idade, o potiguar viu o processo de 14 anos valer a pena – os gêmeos Victoria e Benjamin vieram ao mundo.
Após o nascimento, Victoria logo recebeu alta. Benjamin, no entanto, precisou esperar mais um tempinho para ir para casa. “Ele teve icterícia. Nasceu um pouquinho amarelo. Aí precisou fazer a fototerapia pra pegar uma corzinha durante dois dias. Depois recebeu alta”, explicou Tiago.
Ao sair da maternidade, os pais enfrentaram outro desafio. Dessa vez, no registro dos filhos. “Foi muito difícil, muito burocrático e desnecessário. A gente foi obrigado a reconhecer união estável ou casar pra registrar nossos filhos. Eu não entendo a necessidade disso, porque um casal heterossexual não tem que passar pela mesma coisa. Foi super complicado, mas fizemos a união estável e registramos eles”, relatou o pai.
Depois de todo o sufoco, a família está reunida na casa da mãe de Tiago, em Natal. Os pais dos recém-nascidos estão correndo atrás dos trâmites para traduzir os documentos; afinal, por terem pais de origens diferentes, Victoria e Benjamin automaticamente têm dupla nacionalidade – brasileira e canadense. Com isso, em maio, os quatro devem estar embarcando para o país norte-americano.
“Nós vamos ficar em Natal até o dia 16 de maio, porque eles não podem viajar ainda por causa do ouvido, que pode estourar no avião. E também tem as vacinas, que eles têm que tomar antes”, contou Tiago.
Tiago Machado e Louis Bellemare são o segundo casal homoafetivo a ter filhos através de barriga solidária no Rio Grande do Norte. No entanto, eles formam o primeiro casal de homens a conquistar o feito – o primeiro era composto por duas mulheres.
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