Há pouco mais de um mês, aconteceu mais um caso trágico de abuso e assassinato de uma menina no Rio Grande do Norte. Maria Fernanda, de 12 anos, desapareceu no dia 31 de agosto. Depois de cinco dias de intensa investigação, um homem foi preso e confessou que matou a menina, abandonando o corpo em um matagal e queimando o veículo.
O diretor da Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), delegado Márcio Lemos, disse que o suspeito do crime ofereceu uma carona a Maria Fernanda e a levou até a Praia de Pitangui. A menina tentou fugir do veículo, mas o homem a alcançou, estuprou, matou e enterrou o corpo.
Diante de mais um caso triste que entra para as estatísticas dos crimes contra crianças e adolescentes, o diretor da DHPP, Márcio Lemos, falou que é preciso divulgar e conscientizar que criança não namora, criança não dá consentimento para relação sexual.
No Rio Grande do Norte, 911 crianças e adolescentes até 17 anos sofreram estupro de vulnerável ou importunação sexual até o dia 24 de novembro deste ano. Os dados foram registrados pela Coordenadoria de Informações Estatísticas e Análises Criminais (Coine).
Em um mundo cada vez mais conectado, onde a infância parece se transformar a cada dia, o debate sobre os limites do que é saudável e adequado para as crianças se torna urgente.
A campanha “Criança Não Namora”, organizada pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, busca alertar pais, educadores e a sociedade sobre a importância de respeitar o tempo e o espaço natural das crianças, preservando suas etapas de desenvolvimento e protegendo-as de um tipo de relacionamento que requer uma maturidade emocional e física que elas ainda não possuem.
O juiz da 1ª Vara da Infância e Juventude do Rio Grande do Norte, José Dantas, destaca que todo e qualquer processo de formação da criança deve ser feito no tempo certo, de forma consciente e saudável, para o corpo e para a alma.
Segundo ele, antecipar esse momento é não apenas inapropriado, mas também uma forma de violência que pode ferir direitos fundamentais da criança, como o direito à vida e à saúde em todas as suas dimensões. Para o juiz, a erotização precoce é uma das formas mais nocivas de violência.
Ele explica que os direitos fundamentais da criança envolvem atividades que respeitem sua idade e estágio de desenvolvimento: ter amigos, brincar, estudar, participar de atividades culturais e ser cuidada no seio de uma família. “Namoro não é direito de criança”, afirma Dantas, ressaltando a importância de campanhas que trazem esses temas para o debate, especialmente diante do aumento de conteúdos inapropriados que as crianças podem acessar facilmente.
O Código Penal define que “ter conjunção carnal ou praticar ato libidinoso com pessoa com menos de quatorze anos” é estupro de vulnerável, portanto, crime grave, mesmo que, em tese, haja consentimento.
De acordo com o juiz José Dantas, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte disponibiliza estrutura física e de recursos humanos para atender à criança, ao adolescente e, excepcionalmente, às vítimas ou testemunhas de violência, pelo programa “Depoimento Especial”. O acompanhamento e o atendimento são feitos por esse serviço. “Nossos dados estatísticos mostram que em 70% dos casos os abusos são praticados dentro da própria residência, por quem deveria protegê-los, diferente da exploração sexual que tem outras motivações, especialmente a financeira”, destacou Dantas.
A psicóloga Débora Sampaio, especialista em desenvolvimento infantil e adolescente, chama a atenção para a atual reconfiguração da infância. “Somos a última geração de adultos analógicos, educando a geração digital”, aponta. Segundo Débora, essa nova configuração trouxe uma exposição muito precoce a conteúdos adultos, o que, infelizmente, contribui para a perda da ingenuidade natural da infância. “A infância do brincar passou a ser a infância do celular”, diz ela, destacando o quanto o contato com o mundo digital — onde muitas vezes circulam conteúdos adultos — tem se tornado uma realidade desde cedo.
Para Débora, embora o acesso à internet traga inúmeras possibilidades de aprendizado e diversão, é fundamental que a família esteja atenta e presente para filtrar o que chega até as crianças. Segundo ela, os pais precisam ser os principais aliados na preservação de uma infância saudável, sabendo distinguir o que é próprio da fase infantil e o que deve ficar para quando a criança alcançar a maturidade.
A psicóloga explica que para proteger os filhos e evitar abusos, é preciso criar uma relação de confiança e de diálogo com eles. “É necessário que, desde cedo, possamos orientá-los quanto ao que é o toque bom, o que não é, quem pode tocá-los, quem pode dar banho, quem pode trocar a roupa, orientando-os para que, caso algo aconteça, procurem os pais”, ressaltou.
A prevenção dos casos de abuso pela internet acontece, antes de tudo, por meio da conscientização, do diálogo e da orientação das crianças. “É fundamental, pois elas hoje são crianças no mundo digital. Precisam aprender a viver e a conviver nesse mundo, entendendo que existem predadores, pessoas perigosas, adultos que se passam por crianças, muitas vezes para conquistar a confiança, estruturar uma relação de amizade e depois tentar abusar delas, seja no mundo digital, chantageando ou tentando marcar encontros presencialmente”, explicou Débora Sampaio.
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