Artigo: O PLP 18 é o paciente cuidando do médico

No Rio Grande do Norte, a aprovação do texto atingirá “de morte” os principais programas de alimentação popular para pessoas de baixa renda

por: Foto do autor Daniela Freire

Publicado 11 de junho de 2022 às 23:15

Foto: Agência Senado – Relator do PLP 18, senador Fernando Bezerra Coelho

 

Por Daniela Freire, jornalista, e Thiago Medeiros, sociólogo

 

No dia 25 de maio de 2022, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei Complementar – PLP nº 18, de 2022, que altera o Código Tributário Nacional e a Lei Kandir, entre outras, para considerar bens e serviços essenciais os combustíveis, a energia elétrica, as comunicações e o transporte coletivo. Agora, o texto tramita no Senado e deve ir à votação próxima semana.

O PLP 18 tem um conteúdo irresponsável! Esse Projeto de Lei Complementar ataca diretamente a sustentabilidade financeira dos estados. O indivíduo pode até ser induzido a pensar apenas  nele próprio e não considerar a coletividade, mas essa perda na arrecadação com o ICMS em até 17% afetará os mais vulneráveis e áreas sensíveis dos estados e dos municípios.

E apesar de todas as desvantagens dessa proposta, ainda tem o pior: ela não fará o preço do combustível baixar o suficiente. Esse alívio será mínimo e momentâneo. O próprio relator do projeto, senador Fernando Bezerra Coelho, admite que o preço da gasolina só será reduzido em até R$ 1,65 e do diesel em até R$ 0,76 para os estados que zerarem a alíquota.

Ou seja, estão vendendo a ilusão. A única solução responsável e permanente para baixar o preço dos combustíveis e atacar o problema em sua raiz é modificar o PPI (Preço de Paridade de Importação), que pode ser alterado por ato do presidente Bolsonaro. É o paciente cuidando do médico.

Mas, a quatro meses das eleições, o Palácio do Planalto tem pressa em aprovar esse famigerado PLP 18, uma vez que as pesquisas mais recentes, de institutos diversos, apontam que a inflação corroendo o poder de compra do brasileiro é o fator que mais pressiona para baixo a intenção de votos em Bolsonaro neste momento. O presidente, aliás, é considerado o maior culpado pela alta dos valores e, nesse cenário, ele vem caindo nas sondagens, como mostraram nas últimas semanas resultados do Datafolha, Ipespe e Qaest.

Em meio a esse desespero eleitoreiro o governo federal quer, para ontem, implantar as tais mudanças tributárias, sem sequer dar garantias concretas de uma compensação minimamente aceitável para reparar as gigantes perdas que estados e municípios sofrerão, com reflexos diretos no bem-estar da população.

De acordo com o secretário de Planejamento do Rio Grande do Norte, Aldemir Freire, o montante para a compensação que está sendo oferecido pelo governo federal é “absolutamente insuficiente”. Essa verba compensatória poderá variar apenas de 10% a 30% das perdas, segundo ele explica. “É um projeto equivocado e de natureza puramente eleitoreira”, admite.

A constatação de Aldemir é de que aqui no RN essa perda no recolhimento de ICMS irá atingir em cheio os principais programas de alimentação popular para pessoas de baixa renda: o Programa do Leite e o Restaurante Popular, que deixarão de receber nada menos do que R$ 100 milhões.

Para se ter ideia, esses dois programas potiguares de assistência social alcançam um custo total de R$ 110 milhões. O que significa que tais projetos poderão ficar inviabilizados, já que irão perder a sua principal fonte de financiamento. Desse modo, na avaliação do secretário, o Programa do Leite e o Restaurante Popular serão atingidos “de morte” pelo PLP 18.

De forma geral, Aldemir Freire avisa: o Estado será atingido em cheio e terá R$ 1 bilhão de reais a menos na arrecadação anual. Lembrando que, por lei, os municípios terão frustração na ordem de 25%, totalizando, então, R$ 250 milhões a menos de repasse. A propósito, há cidades em que as contas públicas sobrevivem basicamente desse tipo de arrecadação.

Além disso, sabe-se que o ICMS tem uma importância fundamental para a Saúde, onde estima-se uma perda de R$200 milhões; e para a Educação, que deixará de receber R$140 milhões. Lembrando que enquanto uma parcela ínfima da população não necessita desses serviços gratuitamente, a imensa maioria das pessoas no Brasil e no nosso Rio Grande do Norte sobrevive graças a isso.

“Menos Brasil e Mais Brasília”. Esse parece ser o lema que norteia o governo federal e esse projeto. E em nome disso não se pode sufocar entes estaduais e municipais. É preciso, sim, que haja uma solução para baixar o valor dos combustíveis, mas que ela seja responsável, no mínimo, com o pacto federativo e com a população. Que se encontre um caminho virtuoso para resolver esse problema tão complexo.