Há poucos dias, escutando o episódio “De terno e gravata” do podcast “Sufrágio”, da Folha, que discute cotas para mulheres nas eleições e o machismo nos partidos, conheci a luta travada pela então vereadora pelo PTC, Eudiane Macedo, quando ela foi mãe do primeiro filho, em 2014, e não teve direito à licença-maternidade porque, naquele momento, este direito não estava previsto no regimento interno da Câmara Municipal de Natal.
No exercício do primeiro mandato parlamentar, Eudiane Macedo, que hoje é deputada estadual pelo PV, voltou ao trabalho 30 dias após o parto, acompanhada do filho recém-nascido. Além de precisar da ajuda da equipe de gabinete para manter as atividades como vereadora que, sem a licença-maternidade, ela perderia, pois, a ausência seria considerada abandono do cargo, ela enfrentou as mais diversas dificuldades que vão desde subir escada, devido aos constantes problemas de funcionamento do elevador da casa legislativa, associadas aos desafios de atender às necessidades da criança.
Quando descobriu, ainda grávida, que não teria direito à licença-maternidade, Eudiane Macedo apresentou um projeto de resolução para modificar o regimento interno e garantir a todas as parlamentares o direto a esse benefício, mas encontrou como barreira o machismo dos parlamentares da época – alguns seguem ocupando cadeiras na Câmara Municipal de Natal – sob a alegação de que além de estar legislando em causa própria, a mudança proposta por ela seria injusta com os homens porque daria às mulheres o direito de se ausentar do trabalho por quatro meses.
Sim, você leu direitinho. Homens reclamando do direito pleiteado pelas mulheres à licença-maternidade como se esse período fosse destinado para férias. Esse é um daqueles momentos que a gente escuta sem acreditar na informação que está sendo decodificada pelo cérebro porque, apesar de parecer surreal, infelizmente, é a realidade de uma postura que não ficou no passado.
Naquele momento, contou Eudiane Macedo ao podcast, o projeto que foi apresentado antes do nascimento da criança, foi engavetado até que ela retornasse ao trabalho, com o bebê no colo, e conseguisse articular com apoio da bancada feminina da época a aprovação da mudança do regimento que, agora, garante às vereadoras de Natal o direito à licença-maternidade de quatro meses.
Veja, esse episódio foi há apenas sete anos, visto que aprovação da mudança foi em 2015, e se você, como eu, tiver a curiosidade de pesquisar sobre o registro jornalístico desse episódio à época encontrará apenas uma nota em uma coluna social que se restringe a informar o nascimento da criança, em março de 2014, e que Eudiane Macedo não tiraria a licença-maternidade, como se essa postura tivesse sido escolha, quando na verdade ela não teve! A falta de cobertura sobre esse caso diz muito sobre o jornalismo que é feito por aqui.
O caso da então vereadora de Natal abre o episódio do podcast “Sufrágio” publicado no dia 22 de setembro, mas, infelizmente, não é o único e demonstra, em um conteúdo jornalístico muito bem elaborado com apoio do Pulitzer Center for Crisis Reporting, a importância da diversidade em todo e qualquer ambiente, pois é ela que garante a representatividade nos espaços coletivos.
A um dia das eleições, esta é uma reflexão importante para todos nós, pois, apesar de sermos um país composto hoje por 51,11% de mulheres, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), essa realidade não se expressa na representatividade política e/ou organizacional. Tema também abordado no podcast.
Para pensar um mundo que também veja o que e como vemos e sentimos, nós, mulheres, precisamos estar nos ambientes e nas posições nas quais as decisões são tomadas e, para isso, devemos fazer a nossa parte, o que inclui, entre outras coisas, escolhas que favoreçam essa ascensão. E, não, essa não é uma preocupação restrita às mulheres, mas sim de todos nós, enquanto sociedade.
O podcast “Sufrágio” vale cada minuto dedicado, jornalística e socialmente. Para ouvir, clique aqui!
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