Ex-secretário de Cultura da Bahia e especialista em politicas culturais, ele é um dos participantes da VI Conferência Municipal de Cultura, que está sendo realizada no auditório do Sesc Centro, das 8h30 às 17h
Publicado 30 de março de 2022 às 17:15
Temas importantes para o entendimento das políticas culturais e fomento às atividades culturais, principalmente através das leis de incentivo, estão sendo debatidos na VI Conferência Municipal de Cultura, realizada no auditório do Sesc Centro, das 8h30 às 17h. Especialistas, gestores municipais, técnicos, produtores e a classe cultural debaterão o tema “Uma Política de Estado Para a Cultura: Desafio do Sistema Municipal de Cultura” ao longo dos dias de intensa programação.
Um dos conferencistas do evento é o ex-secretário de Cultura da Bahia, Albino Rubim, especialista em politicas culturais. Ele ficou encarregado do painel 1 da conferência: FEDERALISMO E SISTEMA MUNICIPAL DE CULTURA – Histórico das trajetórias das políticas públicas de cultura no Brasil com ênfase na construção do Sistema Nacional de Cultura, a Importância dos Sistema Municipais na configuração nacional Cultura, direito e democracia. Confira a entrevista de Rubim ao NOVO Notícias:
ENTREVISTA / Albino Rubim, ex-secretário de Cultura da Bahia e especialista em políticas culturais
NOVO – “Federalismo e Sistema Municipal de Cultura” é o tema de sua conferência em Natal. A cidade está em vias de formalizar o seu sistema. Poderia falar um pouco sobre a importância dos Sistema Municipais?
– Organizar o Sistema Municipal de Cultura (SMC) é fundamental por vários razões. O SMC implica em muitas dimensões vitais para o desenvolvimento da cultura. O SMC articula planejamento da cultura, através do Plano Municipal de Cultura; mecanismos de participação cultural, a exemplo da Conferência Municipal de Cultura e Conselho Municipal de Políticas Culturais (ou Cultura) e instrumentos de financiamento da cultura, como o Fundo Municipal de Cultura. A existência de todos esses fatores permite, por exemplo, que os municípios recebam, com mais facilidade e agilidade, recursos de instâncias estaduais e nacionais, como ocorreu recentemente com a Lei Aldir Blanc.
NOVO – O setor público tem um papel fundamental na garantia do acesso da população à cultura, principalmente na manutenção de atividades que não seguem a mesma lógica do mercado, como por exemplo a cultura popular. Por outro lado, esse direito ao fomento não pode se tornar uma imposição. Quais as formas de financiamento simultâneas são necessárias para garantir essa diversidade? As leis de incentivo à cultura ainda são importantes? Que outros mecanismos de fomento podem equilibrar essa balança?
– Concordo que o estado tem papel essencial para manter a diversidade cultural, apoiando manifestações culturais, que sem ele têm dificuldades de se manter de maneira satisfatória, a exemplo das culturas populares, mas também de outras modalidades de cultura, como as experimentais e as de vanguarda. Sem o apoio do estado a diversidade cultural encontra-se em perigo. O apoio, entretanto, não pode significar subserviência ao governo, nem a criação de uma cultura oficialista. A liberdade de criação deve ser mantida.
Com realização ao modelo de financiamento da cultura defendo que ele deve ser tão complexo como é o campo cultural. Ele abrange desde poderosas indústrias culturais até um mestre de cultura popular em povoados no interior do Brasil, desde orquestra sinfônicas até manifestações culturais indígenas na Amazônia etc. Assim, o modelo de financiamento deve englobar diversos mecanismos diferentes, que sejam adequados ao variados tipos de cultura. Sem isso, a diversidade cultural corre risco. O incentivo fiscal é um desses mecanismos. O apoio direto do estado é essencial e deve ocupar lugar de destaque. O fomento do público consumidor é outro instrumento de financiamento vital. Os microcréditos, os financiamentos coletivos e outros modos de fomento também são relevantes.
NOVO – Como as políticas culturais podem tornar a cultura um setor sustentável?
– As políticas culturais sozinhas não podem garantir a sustentabilidade da cultura. Elas têm papel fundamental, mas precisam que outros fatores também contribuam para isso. Se as políticas culturais garantem a diversidade, asseguram formas de fomento não financeiras, apoiam a divulgação e permitem formatos de financiamento adequados, dentre outras medidas, elas cumprem atuação destacada para a sustentabilidade da cultura.
NOVO – Que reflexão o senhor faz sobre a cultura e os desafios no pós pandemia?
– Os desafios da cultura vividos na pandemia foram enormes. A cultura presencial realizada em espaços de conivência sofreu profundamente. Não fosse a vitória da Lei Aldir Blanc, conquistada contra a vontade da gestão federal, o campo cultural estaria em situação ainda pior. Mas a cultura remota, mediada por aparatos sócio-tecnológicos, se expandiu e fez as pessoas suportarem melhor o isolamento social a que as pessoas foram obrigadas pela pandemia. Creio de muitas modalidades da cultura remota vieram para ficar: lives, atividades culturais remotas, reuniões virtuais, ensino à distância etc. É uma boa mudança no campo cultural.
NOVO – O Brasil ainda é considerado um país moderno na aplicação dos sistemas de políticas públicas no setor cultural? Que outros modelos o senhor considera interessantes para o país?
– O Brasil nos tempos de Lula e Gil esteve em lugar de destaque na imaginação e na implementação de políticas culturais. Diversas tiveram repercussão internacional, inclusive sendo copiadas. As gestões de Temer e Messias Bolsonaro desmontaram as políticas culturais; perseguiram a cultura, com censura e asfixia financeira das manifestações culturais; e impuseram uma guerra cultural contra as culturas democráticas e emancipatórias. Assim, hoje o país em termos de políticas culturais não possui nenhuma criatividade e imaginação.
Não concordo muito com a ideia de modelos à copiar ou imitar. Como a cultura tem relação umbilical com as peculiaridades de cada povo, o melhor é pensar que eles têm que inventar políticas culturais próprias para cada país, sem deixar de aprender com as boas políticas culturais existentes no mundo.
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