A hipermoralização

Por Thiago Medeiros, sociólogo

por: NOVO Notícias

Publicado 11 de julho de 2022 às 08:09

A palavra “moral” vem do latim mos ou moris – e significa costumes. Significa que nós vivemos em uma sociedade que contém normas estabelecidas do que é certo e do que é errado. Na política, a moral esteve presente nos estudos de Maquiavel, Thomas Hobbes, Emmanuel Kant e Marx Weber, só citando alguns dos clássicos. Pode-se dizer que a política é um terreno de representação comunitária e social onde os contrários são obrigados a conviver e a tomar decisões coletivas. A partir daí, se estabelece um princípio de transação, caracterizando dessa forma que existe no campo da política adversários e não inimigos.

O impacto da hipermoralização no debate político tem grandes consequências na qualidade da democracia e na construção de consensos ou acordos. Quando os líderes políticos, e seus simpatizantes e/ou militantes radicais, apresentam contestação e oposição política por motivos morais, o fim está próximo. Ninguém reconhece nada aceitável no outro (em sus ideias ou propostas), se considera que suas posições são moralmente ruins e as suas são boas, simplesmente porque são nossas.

O psiquiatra Pablo Malo nos ensina através de suas sábias palavras que “o mundo não consiste em pessoas boas que fazem coisas boas e pessoas más que fazem cosias ruins, porque os maiores males ao longo da história foram cometidas que acreditavam estar fazendo o bem”. A onda populista e de narrativas míticas tem bem esse papel de esconder a verdade por trás das máscaras.

Na política, a hipermoralização contribui para uma polarização extrema e ao fanatismo de ideias. Poderia arriscar que estamos vendo uma inversão, no qual o púlpito democrático, que parte da população não acredita mais, se converteu em púlpito radical e muitas das vezes digital. Desta forma, os indivíduos tribais são alertados para o comportamento dos seus oponentes, que são considerados como o “outro”, aqueles que pensam diferente são considerados inferiores, e claro que a tribo dominante é chamada a agir, pois suas posições são as que deveriam ser e prevalecer por imposição.

A hipótese de ser convencido implicaria para esses indivíduos aceitarem um debate democrático, porém o que assistimos hoje é que esses acreditam que são obrigados a impor suas ideias, negar as do rival e aniquilar o oponente. Lembrando que a maior ferramenta para execução dessa tática são as redes sociais, na verdade, elas representam o campo de atuação desses soldados, que em algum momento poderão invadir o mundo real, o que vem se mostrando possivelmente possível de acontecer, um perigo à vista.

Os “crentes” políticos são aqueles mais propensos ao extremo político, ao maniqueísmo e a considerar os seus rivais (indivíduos e grupos) e adversários como verdadeiros inimigos. A intransigência moral é o núcleo central do desprezo pelo outro, a falta de empatia e solidariedade. Características iminentes e objetivas deste perigoso fenômeno é sua identificação com o mal, que acaba ganhando legitimidade e credibilidade na mão pesada da tribo.

É a prevalência do império da incredulidade com relação a razão. É o império da preferência pelo castigo do que a justiça, por isso o desprezo pelas instituições tem se mostrado fundamental para estes que pensam assim, o iluminismo não é mais necessário, volta-se aos primórdios das trevas.

Thiago Medeiros, sociólogo

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