Em entrevista à coluna Daniela Freire no impresso do Novo Notícias, publicado nesta terça-feira, o secretário estadual de Saúde analisou as críticas recentes à sua gestão feitas por políticos da oposição
Publicado 16 de novembro de 2021 às 21:45
Impulsionados pela proximidade da campanha eleitoral de 2022 e, provavelmente, também pelos resultados das pesquisas divulgadas até agora, políticos de oposição ao Governo Fátima Bezerra colocaram, nos últimos dias, a gestão da Saúde do RN no epicentro de críticas severas, feitas com base na repercussão de vídeo do homem que morreu por ter atendimento recusado em unidades de saúde do Estado e do município de Natal (!). Em entrevista à coluna Daniela Freire no impresso do Novo Notícias desta terça-feira (16), o titular da pasta da Saúde do RN, médico Cipriano Maia, alvo principal do tiroteio, que teve a exoneração pedida por deputado e a sugestão de intervenção federal feita pelo ministro-candidato Fábio Faria, disse lamentar que “agentes políticos que deveriam estar contribuindo para solucionar a crise se aproveitem dela para tirar proveito e fazer a politicagem mais rasteira, ao invés de usar o debate para entender a raiz do problema”.
“Na verdade, a intervenção federal que nós precisamos é para o SUS do Estado, não é para o Governo, é de mais recursos, mais apoio técnico, e não de denúncias caluniosas, de acusações, de oportunismo diante da tragédia alheia”, afirmou. Na visão do secretário de Saúde, o RN precisa é de políticos com “atitudes responsáveis”, que discutam “os problemas e apontem soluções”, e não que fiquem “fazendo politicagem partidária em véspera de eleições, com acusações e atitudes que não são condizentes nem com o cargo parlamentar, nem com cargo de ministro de Estado”.
Cipriano Maia ressaltou que “alguém que está no governo federal e quisesse cargo de ministro, deveria estar ajudando a aumentar o teto financeiro do Estado, que é subfinanciado”. “Do gasto do SUS no Estado, a União só entra com 26%, e o Estado entra com 74%. Então, um ministro de Estado deveria estar contribuindo para aumentar o aporte de recursos”, avaliou Cipriano. “Quando a gente apresenta e cobra, o Ministério diz que não tem o que fazer. Então um ministro de Estado deveria estar tendo a preocupação com isso. Assim como corrigir os valores da tabela SUS, que estão na base da sobrecarga para Estados e Municípios”, cobrou o secretário.
Ainda na entrevista, o secretário de Saúde também abordou outros assuntos importantes, como o cenário atual de aumento nos casos de covid-19 no RN e a expectativa da realização do Carnatal 2021. Ele lembrou que a micareta foi autorizada “em um contexto bastante confortável”, diferente do atual, e ressaltou: o governo está “avaliando os dados desse período mais intenso de interação social, para que o evento ocorra sem risco maior”.
Leia na íntegra a entrevista do secretário de Saúde do RN, Cipriano Maia, à coluna Daniela Freire:
1 – Secretário, a repercussão do vídeo do senhor que morreu após ter atendimento recusado em unidades de saúde do Estado e do município de Natal acabou gerando uma onda de críticas à Saúde do RN por parte da imprensa e de políticos da oposição, como o deputado Nélter Queiroz, que sugeriu a sua exoneração, e o ministro Fábio Faria, pré-candidato a senador, que pediu, em suas redes sociais, que o governo federal avaliasse uma intervenção na Saúde potiguar. Como o senhor analisa esses posicionamentos políticos e a forma como o assunto foi tratado?
Analiso de uma forma muito tranquila. Tenho 40 anos de serviços prestados ao SUS, participei desde a sua construção e sempre com dignidade procurei atuar, seja na formação profissional, como médico ou como gestor, sempre agindo com muita responsabilidade. Lamento que agentes políticos que deveriam estar contribuindo para solucionar a crise se aproveitem dela para tirar proveito político e fazer a politicagem mais rasteira, ao invés de aproveitar o debate para entender a raiz do problema. A raiz do problema tem o histórico de desestruturação do SUS, de subfinanciamento, agravado pela diminuição do aporte federal de recursos, desde a edição da emenda constitucional que congelou os gastos sociais.
No caso do Estado há uma situação financeira que se agravou em 2021 pelo não aporte de recursos excepcionais para o enfrentamento da pandemia, quando tivemos a pior onde, entre fevereiro e julho, e onde o Estado teve que aportar mais recursos, junto com os municípios, para ofertar leitos e salvar vidas no Rio Grande do Norte, o que fizemos com toda competência, organizando leitos em todas as Regiões de Saúde, que salvaram mais de 14 mil vidas, e que infelizmente alguns agentes políticos não querem ver. Só querem ver o problema sem apontar soluções. Alguém que está no governo federal e quisesse cargo de ministro, deveria estar ajudando a aumentar o teto financeiro do Estado, que é subfinanciado. Do gasto do SUS no estado, a União só entra com 26%, e o Estado entra com 74%. Então, um ministro de Estado deveria estar contribuindo para aumentar o aporte de recursos.
Só a Liga Norteriograndense [contra o Câncer] tem produção realizada esse ano que beira R$ 8 milhões, e não tem teto financeiro para atenção oncológica no Estado, que é determinado pelo Ministério da Saúde. Quando a gente apresenta e cobra, o Ministério diz que não tem o que fazer. Então um ministro de Estado deveria estar tendo a preocupação com isso. Assim como corrigir os valores da tabela SUS, que estão na base da sobrecarga para Estados e Municípios. Se uma cirurgia custa, em seu curso real, R$ 2 mil, a tabela SUS só paga R$ 500, os R$ 1500 ficam com Estado e Município, e mesmo assim o Estado vem assumindo sua responsabilidade. Vem inclusive implementando um programa, usando parte do seu teto MAC para expandir cirurgias eletivas, complementando a capacidade dos hospitais estaduais em cada uma das Regiões.
Na verdade a intervenção federal que nós precisamos é para o SUS do Estado, não é para o Governo, é de mais recursos, mais apoio técnico, e não de denúncias caluniosas, de acusações, de oportunismo diante da tragédia alheia. Nós precisamos sim de atitudes responsáveis que de forma compromissada discuta os problemas e aponte soluções, e não ficar fazendo politicagem com a saúde, com a tragédia, com a desassistência da população, pois nós estamos reconhecendo os problemas, mas estamos tentando fazer o possível e o impossível para resolvê-los, e não para fazer politicagem partidária em véspera de eleições com acusações e atitudes que não são condizentes nem com o cargo parlamentar, nem com cargo de ministro de Estado.
2 – Qual o real quadro de precariedade da Saúde hoje aqui no Estado? O senhor disse em entrevista que “a União não aparece”. Até que ponto o Executivo consegue resolver situações como a do vídeo em questão, que são tão comuns, sem o apoio federal?
Nós realmente temos, na saúde do estado, alguns gargalos, assim como em todo o país. Venho destacando a questão do subfinancianento do SUS, a descontinuidade de políticas por parte do governo federal, o que termina sobrecarregando estados e municípios. Sentimos falta de programas que cooperem no financiamento, por exemplo, da regionalização da saúde, estruturação de policlínicas, aumentar o teto de investimento em cirurgias. Estamos buscando realizar isso aqui em parceria com os municípios, através dos consórcios, para otimizar recursos. Mas, a grande batalha é por mais financiamento federal ao SUS. Apresentamos isso à bancada e discutindo em todas os espaços. Temos, por exemplo, a questão da manutenção das UTIs que serviram para tratar da Covid-19. O governo federal propôs um custeio de R$ 1 mil por mês, quando um leito custa três vezes isso. É preciso que a União chegue, pois por mais que se racionalize recurso, as gestões municipais e estadual têm limitações. Ainda mais no Rio Grande do Norte, onde herdamos não só quatro folhas salariais, mas um passivo de dívidas, um estoque de 20 mil cirurgias eletivas, entre outras coisas. E sem recursos é impossível avançar.
3 – Como o senhor avalia a possibilidade de divulgação de uma campanha educativa e explicativa sobre o funcionamento administrativo da Saúde para ensinar a população a usar o sistema de saúde e procurar ajuda no lugar certo e na hora certa?
O Ministério da Saúde tem divulgado essa lógica da hierarquização das redes de atenção, onde o município é responsável pela atenção primária e encaminhar os casos que não resolve para a assistência ambulatorial especializada. Em caso de urgência, unidade básica ou UPA mais próxima. E assim, sucessivamente. É preciso estar constantemente divulgando para a população. Por isso, estamos trabalhando junto aos municípios para ampliar esse acesso à informação, para que o povo fique ciente de qual o lugar procurar para cada caso, evitando que se congestione unidades que não são desenhadas para atender a determinadas situações.
4 – Secretário, além dessa questão específica do vídeo viralizado, o senhor também enfrentou a suspensão das atividades por parte da Cooperativa de Anestesiologistas do Rio Grande do Norte (Coopanest/RN). Na última quinta-feira, a Sesap divulgou nota afirmando a retomada das atividades e dando garantia de que tem “feito todo esforço para honrar os compromissos propostos”, mas ressaltou que apesar de a responsabilidade pelos contratos ser dividida entre Estado, município e União, os dois últimos, que também têm dívidas em aberto, não dialogou com os fornecedores. O quanto essa ausência atrapalha?
Este contrato não é com o Governo do Estado, para deixar claro. Essa paralisação afeta, neste caso, os atendimentos contratados pelo município de Natal. Como o valor da tabela do SUS é muito baixo, o Governo coopera com uma complementação no financiamento para viabilizar os serviços, que inclui cirurgias, exames de alta complexidade, transplantes e outras coisas. Por vezes há atrasos nessa complementação, seja por parte do estado como do município. Desde agosto a Sesap está negociando as pendências de sua parte e firmou acordos para o passivo, mantendo regular o pagamento em dia da última fatura apresentada. É muito ruim a ausência dessa negociação por parte do município, pois as pessoas estão necessitando dos atendimentos. Fizemos um apelo para que as cooperativas e os hospitais retornem, assim como esperamos que Natal possa resolver sua parte o mais rápido possível. Com relação à contrapartida da União, soubemos que nesta sexta-feira a situação foi sanada.
5 – Mudando de assunto, secretário, qual a causa do crescimento na ocupação dos leitos de pacientes com covid-19 que vimos nos últimos dias? Que estava em 24% e agora está acima de 40%. Há uma explicação para esse aumento? O senhor confia na realização de eventos de grande porte, como o Carnatal?
Continuamos analisando o cenário da pandemia, com o auxílio do comitê científico. Identificamos, como já é sabido, recentemente um aumento moderado nos casos. É uma constatação clara a partir do momento em que mais pessoas passaram a circular, assim como em alguns casos pelo desrespeito aos protocolos de segurança, principalmente o uso da máscara. Porém, o mais grave é o negacionismo. Pessoas que não acreditam na vacina, às vezes até seguindo, infelizmente, orientação de lideranças nacionais, e que têm morrido. Tivemos na quinta e na sexta-feira seis óbitos por Covid-19, todos de pessoas não vacinadas. Por isso seguimos orientando para que se continue usando máscara, mantendo distanciamento, além de insistir na necessidade da vacinação. Só com a vacina vamos manter esse controle. Quanto aos eventos, estamos autorizando a retomada dentro da obrigação dos protocolos. Reativamos o Pacto pela Vida, justamente para fiscalizar nesses locais se estão obedecendo as exigências, principalmente o passaporte vacinal. O Carnatal foi autorizado em um contexto bastante confortável. Estamos avaliando os dados desse período mais intenso de interação social, para que o evento ocorra sem risco maior, pensando sempre no cuidado com a vida. Desejamos que a situação permaneça assim, para que as pessoas tenham esse momento de alegria.
6 – E para terminar: Como o senhor tem encarado o fato de ser tratado como investigado na CPI da Covid do RN? Segundo o presidente da comissão, deputado Kelps Lima, o senhor é investigado em 11 dos 12 processos analisados pela Casa.
Estou muito tranquilo, pois como diz o ditado, quem não deve não teme. Tenho 41 anos de serviços prestados à sociedade. Desde minha atuação como médico sempre fui cumpridor dos meus deveres. Comecei no interior, ia da manhã de segunda até sexta à tarde, cumprindo meus horários e atendendo o povo. Assim fiz minha vida como médico e professor, formando profissionais de saúde, sempre com muita responsabilidade. Como gestor, fui pró-reitor na universidade e secretário de saúde de Natal, tirando um sistema que estava em bancarrota para um patamar muito melhor em dois anos. Infelizmente, há um jogo político que tenta ver nos outros o que carrega em si. Vê, por ignorância ou má fé, qualquer erro formal ou de procedimento como corrupção. Tivemos sim erros, o que é normal. Porém até agora a CPI não apontou nada que indique qualquer desvio, favorecimento de alguém, um mero encontro suspeito que seja. O que fizemos foi uma aplicação de recursos, com muito rigor, para salvar vidas, como é patente. Estou tranquilo, de consciência tranquila e sem temor. Foi um trabalho coletivo de todos os servidores da saúde durante essa pandemia que precisa ser reconhecido. Temos que nos orgulhar, isso sim. Corremos riscos, até de sermos criminalizados. Espero que a justiça seja feita. E quem nos difama, seja alcançado também pela justiça lá na frente.
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