Autor prolífico, com uma produção vasta e diversa, o escritor, pesquisador, historiador e pensador Peter Lamborn Wilson (1945-2022) foi sobretudo um poeta, em suas próprias palavras. Embora tenha se notabilizado como prosador/teórico, escreveu cerca de 1.500 poemas, publicados em diversos livros ao longo de sua vida. Até hoje, nenhuma dessas obras, ou mesmo uma compilação, havia sido lançada no Brasil. Isso muda com a publicação de “Divinações”, livro inédito, bilíngue (inglês/português), que reúne 108 poemas representativos de sua produção poética.
Com 320 páginas, é o 92º título publicado pela Sol Negro Edições, editora independente de Natal/RN que há 13 anos se dedica a lançar obras com qualidade literária e gráfica focadas em autores e temas ignorados pelas grandes editoras e conglomerados de mídia. Geralmente a produção é artesanal, mas “Divinações”, devido à grande quantidade de páginas, será impresso em gráfica, sob demanda.
O livro está em pré-venda por R$ 85,00 e pode ser adquirido diretamente com a editora por meio de seu Instagram (@solnegroeditora) ou e-mail (edsolnegro@hotmail.com), com pagamento em pix ou no cartão.
O trabalho de pesquisa, seleção e tradução dos poemas é do poeta Márcio Simões, idealizador e editor-artesão da Sol Negro Edições, pela qual já publicou, como tradutor, “Visões das filhas de Álbion”, de William Blake (2012); “Postais do Peru”, de Thomas Rain Crowe (2013); “O fruto de Saturno”, de Yvan Goll (2013); “Você dorme, senhor presidente?”, de Calpolicán Ovalles (2019); “As últimas palavras do poeta & outros escritos”, de René Daumal (2019); “Últimos poemas”, de Gregory Corso (2023); “Poemas da nuvem louca”, de Ikkyu Sojun (2023); e “O amor a poesia”, de Paul Éluard (2024).
O interesse por autores obscuros ou trabalhos relevantes com pouca visibilidade levou Márcio Simões a um profundo mergulho na obra poética de Peter Lamborn Wilson, autor que ficou conhecido na virada dos anos 1980 para os anos 1990 sob o pseudônimo de Hakim Bey, especialmente por meio dos livros “Chaos: the broadsheets of ontological anarchism” (1985) e “TAZ: the temporary autonomous zone” (1991) – ensaios culturais em tom de manifesto traduzidos e publicados no Brasil pela Conrad no início dos anos 2000 como “Caos: terrorismo poético & outros crimes exemplares” e “T.A.Z.: zona autônoma temporária”.
Os 108 textos de “Divinações” foram escolhidos entre quase 1.500 poemas publicados por Lamborn Wilson em livros como “Gothick institutions” (2005), “Black fez manifesto” (2008) – último que assinou como Hakim Bey e o único de poemas –, “Ec(o)logues” (2011), “Riverpeople” (2013), “Hoodoo metaphysics” (2016), “Lucky shadows” (2018), “Vanished signs” (2018), “Thibault or the secrets of the sea” (2020), entre outros.
“Procurei traduzir aqueles que achei mais expressivos, bem realizados formalmente e cuja mensagem fosse mais forte ou contundente, já que ele é bastante enfático em suas críticas. Também escolhi alguns que achei que dialogavam com sua prosa, mantendo certo tom de manifesto. E foram muito relevantes as escolhas de Raymond Foye, amigo e editor dele, que me mandou uma lista com seus poemas preferidos, embora tenha me deixado totalmente livre para escolher. E por último, porém não menos importante – pois esse foi um critério definidor – poemas cujas versões em português, na minha visão, fizeram jus aos originais e se sustentaram como poemas em português”.
O título e a quantidade de poemas selecionados têm toda uma relação com os processos e vivências de Wilson, conhecido também por sua forte conexão com o misticismo, o esoterismo e a espiritualidade oriental. “Divinações nos pareceu apropriado porque remete ao ato de descobrir algo por intuição ou pela interpretação de sinais, ou mesmo a algo que, por diversão, se apresenta a alguém para ser decifrado; e 108 é o número de repetições necessárias para alterar a consciência na tradição indiana.”
Márcio Simões teve contato com a obra de Lamborn Wilson no começo dos anos 2000, na UFRN, quando cursava letras. “Não na sala de aula, claro. Mas nos corredores e arredores. As traduções da Conrad haviam acabado de sair e circularam bastante entre a galera antenada e ‘subterrânea’ do setor II e adjacências. Não lembro exatamente a primeira coisa que li dele, mas tenho minha edição de ‘Caos’ desde essa época.”
Ao comentar sobre a poesia de Peter Lamborn Wilson, Márcio destaca que ela difere da poesia dos seus contemporâneos da cena underground americana dos anos 1960/70. “A poesia de Wilson não é autobiográfica ou confessional como a maioria. É antes uma escrita palimpséstica, em que os mais variados elementos culturais – eruditos e populares – são evocados para articular alguma percepção ou mensagem do autor. Se por um lado seus poemas são cheios de bile contra a civilização industrial, por outro lançam um olhar atento e respeitoso ao mundo natural, dão livre curso à imaginação e são sempre dotados de humor e ludicidade, seja num soneto ou em prosa poética.”
Peter Lamborn Wilson nasceu nos arredores de Baltimore, no estado de Maryland, nos Estados Unidos, em 20 de outubro de 1945, e morreu em 22 de maio de 2022, aos 76 anos, encerrando uma das existências mais profundas e significativas a despontar na segunda metade do século 20.
Além de poeta, foi ensaísta, escritor, tradutor, editor, pesquisador, historiador e um pensador amplamente reconhecido por suas ideias provocativas. Autor de mais de 50 títulos, escreveu sobre utopias piratas, sonhos iniciáticos, nomadismo, terrorismo poético, caos e anarquia ontológica, buscando na história e na filosofia as bases de uma doutrina de liberdade individual e coletiva.
“T.A.Z.: Zona Autônoma Temporária”, sobre a criação de espaços temporários que escapam às estruturas de controle, foi um dos livros mais discutidos dos anos 1990. Recebido com entusiasmo por gente como Allen Ginsberg e William Burroughs, tornou-se um clássico contemporâneo, influenciando os mais diversos movimentos sociais e artísticos.
Teve vida atribulada, morando cerca de dez anos no Oriente, viajando pela Índia, Nepal, Afeganistão e fixando-se no Irã na década de 1970. De volta aos EUA nos anos 1980, dedicou-se a escrever e estudar o sufismo e o anarquismo, propondo em sua obra uma síntese política – e poética – entre misticismo e crítica ao poder, articulando heresias islâmicas e doutrinas libertárias numa visão de mundo subversiva e antissistema, e se tornando uma voz incontornável na cultura alternativa e de resistência ao capitalismo global.
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