Elisa com o filho Miguel - Foto: Arquivo pessoal

Cotidiano

Maternidade Mãe à distância: afetos virtuais, amor resiliente

Fotógrafa potiguar que está fazendo um doutorado em Madri (ES) relata ao NOVO as emoções e pensamentos sobre passar o Dia das Mães longe do filho de 8 anos e também de sua mãe, que mora na Argentina

por: NOVO Notícias

Publicado 10 de maio de 2024 às 11:26

 

Elisa Elsie ao lado do filho Miguel – Foto: Arquivo pessoal

 

A fotógrafa e doutoranda Elisa Elsie está há um mês em Madri, na Espanha, para fazer um doutorado sanduíche de 6 meses. Neste domingo (12), Elisa passa o primeiro dia das Mães longe de Miguel, seu filho de 8 anos, que ficou em Natal; e longe também de sua mãe, Cintía, que mora na Argentina há quase seis anos. Diante das distâncias, o NOVO pediu a Elisa um relato sobre como está sendo esse período. “Não tem um dia sequer em que não pense nele. Ando com um caderninho na bolsa, anoto aí e no celular lugares legais e parquinhos que vou vendo pelas ruas e que quero levá-lo quando estiver aqui de férias”, diz.

Lei abaixo o relato em primeira pessoa:

“Esta é a primeira vez que passo o dia das mães longe do meu filho desde que ele nasceu, em 2016. Esta também é a primeira vez que fico tanto tempo separada dele. Dia 05 de maio completou um mês que nos despedimos no aeroporto depois de muito abraço, beijo e “eu te amo”. Ali embarquei para um período de doutorado sanduíche em Madri (Espanha) com duração de seis meses e ele seguiu na vida com o pai e o irmão. Esse tempo longe de casa seria impossível sem o apoio do meu marido, Everton Dantas, que desde o início incentivou o projeto, mesmo sentindo tanto medo quanto eu em relação ao novo formato que ia se estabelecer. Decidimos seguir juntos, em mais um plano familiar cheio de incertezas.

Quando apliquei para a bolsa, no final de 2023, o plano era trazê-lo comigo. Mas nem tudo saiu como planejado e a permanência dele na cidade seria melhor para toda a família, inclusive para ele que estava vivendo um momento de transição escolar. Foram muitas conversas, explicações e choro ao longo dos quase três meses que separaram o dia do resultado ao dia da viagem. Até então, nunca tinha feito terapia, mas tive a certeza que o momento tinha chegado. Fui tomada por um sentimento terrível de culpa por imaginar que ele poderia se sentir “abandonado” por mim ao longo dos meses. Pensei em desistir da bolsa e seguir a vida ao lado dele. Nos primeiros encontros com a terapeuta o choro era livre e durante nossos encontros semanais até a semana da viagem consegui ressignificar essa temporada distante como um investimento importante na minha carreira acadêmica, profissional e pessoal.

Não tem um dia sequer em que não pense nele. Ando com um caderninho na bolsa, anoto aí e no celular lugares legais e parquinhos que vou vendo pelas ruas e que quero levá-lo quando estiver aqui de férias. Faço fotos e vídeos de lojas, praças, parques e museus que imagino que ele vai curtir quando chegar — daqui a 44 dias. Compro presentinhos e escrevo cartas semanalmente. Maternar à distância é novidade e inaugurou um novo formato de relacionamento virtual e afetivo que nem sempre funciona. As cinco horas de fuso horário são um desafio. E como toda criança, ele quer jogar, ler, brincar com amigos e muitas vezes a conversa de áudio ou vídeo não ganha desses interesses. É um aprendizado diário lidar com as minhas frustrações quando não conseguimos conversar. A melhor parte é quando ele me conta histórias da escola, da vida, dos amigos. Todas as vezes que ele fala “mãe”, e aí segue em algum assunto, fico com o coração apertado. Ouví-lo me chamar de mãe é um pequeno presente no meio dessa saudade toda.

Este ano também passo o dia das mães longe da minha, que há cerca de cinco anos mudou de país em busca de melhor qualidade de vida e saúde. Mamãe é uma mulher admirável. Faz refeições em formato de amor, abriu mão de toda uma vida profissional para cuidar das três filhas e até hoje é muito gostoso quando estamos juntas. Essa semana ela me mandou um áudio contando que havia sonhado com nós três adultas, pela primeira vez. Porque os sonhos sempre eram com as filhas crianças. Subíamos montanhas, corríamos de lobos e ficávamos juntas numa casa no meio de uma floresta na Austrália. Foi lindo de ouvir a voz dela contando tudo isso. E claro que fiquei emocionadíssima e passei o resto do dia pensando: porque será que justo agora ela sonhou com nós como mulheres adultas? Não vou ter essa resposta. Nem ela. Mas pedi que sempre gravasse áudios com os sonhos. Esse é um hábito que tenho com meu filho, de perguntar quase todas as manhãs com o que ele sonhou. E é uma delícia ouvir os relatos matinais — às vezes bem mirabolantes.

No último sábado, recebi o relatório escolar trimestral de Miguel, o primeiro na escola nova. Feito por professoras/es e a coordenadora sobre o desenvolvimento dele como criança novata na turma. Chorei tanto com o texto, de alegria, que tive de parar várias vezes para enxugar as lágrimas e seguir na leitura. Elogios ao comportamento, à forma de se relacionar com as demais crianças, ao desenvolvimento cognitivo e a participação dele nas aulas. Claro que existem desafios pessoais a superar e que foram pontuados ao longo do documento. Mas foi gratificante poder ler tantas coisas legais sobre esse ser humano massa que ele é.

Eu não tinha planos de ser mãe, já era madrastra e estava satisfeita com nossa pequena família de três pessoas. Descobrir a gravidez foi um baita de um susto, mas hoje não consigo imaginar uma vida sem filho. A cada dia dá para perceber que nossas vidas são melhores, mais animadas, mais caóticas e com mais demandas de trabalho relacionados ao cuidado. Quando o filho nasce, o tempo parece encolher e é preciso reaprender a viver entre as brechas desse cuidado. Há dez anos estudo a temática da maternidade sobre diferentes perspectivas. Agora no doutorado investigo como as relações inter geracionais entre as mulheres mães podem tecer as fotografias familiares. A maternidade não passa despercebida para nenhuma mulher. A transformação na vida é imensa e intensa. A crueza e visceralidade da chegada de uma criança modifica para sempre a relação das mulheres com a sociedade e com a vida. É impossível ignorar as lutas feministas por direitos iguais e pela visibilidade de todo o trabalho associado à criação de filhos que socialmente e historicamente é assimétrico em relação aos gêneros. Para mudar essa realidade, o presente e o futuro precisam ser coletivos, feministas e com um olhar atencioso para as crianças”.

______________________________________________________________________________________________

Quer receber notícias úteis, relevantes, informativas e divertidas?

➡️ Assine gratuitamente a Comunidade do NOVO no Whatsapp.
➡️ gratuitamente o Canal de Notícias no Telegram.
➡️ Siga o NOVO Notícias no Twitter.

______________________________________________________________________________________________

Tags